Andrea Nogueira

16/02/2019 11h34
 
A Indústria do “Chifre”
 
O dano moral indenizável existe, é real e está previsto na Constituição Federal.
 
Não havendo condições amistosas para resolver as questões que ferem o caráter, a vida íntima ou tiram a paz de uma pessoa, esta pode socorrer-se do judiciário em busca de uma indenização na tentativa de apaziguar sua alma com uma compensação financeira paga por quem lhe causou um dano. E assim, o poder judiciário contribui com o equilíbrio social desestimulando práticas contra a moral de outrem.
As maiores empresas “causadoras de aborrecimento alheio” conseguiram impregnar no judiciário uma teoria chamada “Indústria do dano moral”. Com isso, pretenderam construir a ideia de que as pessoas queriam se aproveitar das finanças delas para enriquecer, alegando falsa, ou insignificante, dor e sofrimento causados pela prestação de serviço ou descumprimento de cláusulas contratuais. A ideia pegou. Tanto que o reconhecimento, por juízes, da má prestação de serviços de incontáveis empresas resulta em daninhos de R$500,00, R$1.000,00 ou R$2.000,00 após um litígio de quase quatro anos. Dói quase nada na empresa que, coincidentemente, continua sendo processada diariamente por várias outras pessoas, pelas mesmas razões ou razões similares.
 
Agora, a indenização por dano moral chegou, de forma mais recorrente, no direito das famílias. 
 
Recentemente uma decisão do Superior Tribunal de Justiça passou a causar tamanho frenesi, que já começa a chamar a atenção dos causadores de danos para a ideia de trazer a teoria da “Indústria do dano moral” para o debate sobre os prejuízos suportados pelo descumprimento do contrato conjugal.
 
Reconheceu o STJ que a traição no casamento e na união estável é descumprimento de dever conjugal que acarreta a aplicação de sanções ao infiel (Agravo em Recurso Especial n. 1.269.166_SP-SP). Dentre estas sanções (punições) está o dever de indenizar pelo dano moral causado a quem sofre com a traição.
 
A tese do dano moral, nesses casos, é defendida por advogados e advogadas do Brasil inteiro, por décadas. E no que pese a possível existência de anteriores decisões judiciais que reconhecem a dor indenizável de quem é traído, nada até o momento tem sido significativo ao ponto de amplamente desestimular o descumprimento da cláusula de fidelidade prevista nos contratos, formais ou tácitos, de união das pessoas com o objetivo de constituir família.
 
Mas a insistência da advocacia na tese desse dano moral indenizável já resulta em novos rumos jurisprudenciais. As novas famílias, motivadas pelo avanço legislativo e livre-arbítrio de homens e mulheres para fazerem sua escolha de casar-se ou não são fatores que estimulam o reconhecimento do dano moral indenizável para os casos de traição.
 
Agora, resta saber se a teoria da “indústria do dano moral” ou, neste caso, a “Indústria do Chifre” será amplamente invocada para tentar diminuir a responsabilidade dos infiéis. E se invocada, se terá a mesma força de convencimento das grandes empresas, financeiras, empreiteiras e outros fornecedores de serviços e produtos, perante os Juízes.
 
De todo modo, importa frisar que o reconhecimento do dano indenizável causado por traição no casamento e na união estável é um grande avanço jurisprudencial. É também o reconhecimento de que, hodiernamente, permanecer casado é opção e não obrigação, valendo, portanto, observar e cumprir suas explícitas ou implícitas regras de convivência.
 

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