Nicole Tinôco

02/08/2019 09h05
 
A era do “tá tudo bem”
 
 
Semana passada incorporei aos meus conhecimentos um conceito novo chamado positividade tóxica. Refere-se a essa tirania de positividade que tomou conta da nossa sociedade. Para simplificar, é essa coisa de estar todo mundo sempre muito bem. E mais, ter que estar bem. 
 
Por óbvio se apegar a sentimentos ruins não é uma coisa saudável, porém ignorar a complexidade das nossas vidas nos reduzindo a um mundo cor de rosa onde tudo é bonito e feliz é, no mínimo, irresponsável com as dores alheias. 
 
Fingir estar feliz o tempo todo, enfiando-nos mantras “entregue, confie, agradeça” , não levando em consideração as frustrações e intempéries que a vida nos sujeita parece ser a máxima adotada pela nova geração que demostra ter saído direito de um livro motivacional com suas frases de efeito e canções de mundo ideal. 
 
Claro que eu gostaria de estar sempre cantarolando que a “sorrir eu pretendo levar a vida”, mas tantas vezes há dias que a gente se sente “como quem partiu ou morreu”, não é mesmo? E entender que se sentir assim não tem problema é tão mais coerente, e não te torna um extra-terrestre admitir que nem sempre é possível ostentar a alegria no rosto. 
 
A compulsoriedade do “ser feliz” é tão tóxico que pode levar diretamente à infelicidade. Vivemos em uma sociedade na qual ninguém tem interesse no que o outro sente. É bem comum diálogos que se resumem em “tá tudo bem e com você, bem também”. Conversas rasas, que resumem a lógica de que é melhor tomar como verdade o pouco, pra não se envolver no verdadeiro mundo do outro. 
 
Na era do “Good vibes only”, as pessoas são tão espiritualizadas, tão conectadas com seus “eu superiores”, mas a positividade termina ao se deparar com “pessoas tóxicas”. Leia-se, toda e qualquer pessoa que não vomite flores o tempo todo se torna não interessante em conviver neste universo de felicidade, estando fadadas ao isolamento social. 
 
Que espécie de felicidade coletiva é essa que não suporta qualquer presença de sofrimento psicológico? Reprimir nossas dores e aspectos que nos fazem humanos é a única solução ao pretenso ator social moderno? 
 
O sucesso absoluto, a alta positividade e a motivação sem fim num país que, segundo a OMS, ostenta o título de maior número de depressivos da América Latina, é líder também no ranking de transtorno de ansiedade. E que enquanto em diversos países o número de suicídios vem regredindo e  aqui aumentando em 30% nos últimos 28 anos, parece um tanto quanto sem sentido prático. 
 
Ser positivo é bacana, a positividade tóxica não. Respeitemos as dores , angústias e principalmente a humanidade que nos faz seres complexos e completos de uma infinidade de sentimentos. Qualquer coisa aquém disso é, conforme outro conceito moderno, a mais pura fake news.
 
 

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