Nicole Tinôco

03/11/2017 11h11
No meio do caminho tinha uma pedra, tinha.
 
Do hospital a família Andrade recebe o último boletim médico :
 
"O estado dele é muito delicado. As lesões são de gravidade leve a moderada , entretanto devido ao avançar da idade atingiu  órgãos diversos , não sendo possível precisar com exatidão quais foram, sempre p auxilio de agressiva intervenção cirúrgica . Devido ao avançar da idade as possibilidades do paciente  são ínfimas . Mas, é imprescindível  que se conste a bravura e resistência deste guerreiro de 115 anos em se manter vivo. Dizem que de tristeza não se morre , mas depois de 11 agressões temo muito pelo órgão mais importante do Sr. Carlos : seu humano coração.”
 
Fruto da minha imaginação, claro. Acredito que este seria o boletim médico de Carlos Drummond de Andrade após o episódio de "violência explícita" proferido em desfavor do poeta na última segunda feira. 
 
Enquanto o "gueto cultural" de Minas e de diversas capitais do país planejava ações em comemoração ao seu aniversário de 115 anos, um "nobre  cidadão" carioca , cidade em que o poeta faleceu no ano de 1987, o agrediu de forma desumana.
 
O "recatado" homem,,  arrancou-lhe os óculos.  Violência esta que já conta com 11 casos semelhantes . Ao ouvir a notícia doeu-me a alma. Conheci "Drummond estátua " em 2011 na primeira vez em que coloquei os pés na cidade maravilhosa . Sentei ao lado dele , dei "cheirinho", como se fosse um tio distante e querido que mora lá longeee. Este “elo” foi  formado nas páginas dos meus livros de quarta ou quinta série em uma linda cooperativa educacional que estudei . 
 
Em tempo. Acho melhor providenciáramos lentes de contato ao nosso querido Drummond, chega de roubarem-lhe os "olhos".
 
Me pego pensando . Se nem o mais influente,  humano e imponente poeta brasileiro passa incólume a violência , quem dirá nos, meros "mortais" ? O assunto é válido , e precisa ser debatido com seriedade mas como sempre o primeiro tópico nunca é o que eu realmente quero abordar .. (vai chegar uma hora que vocês vão começar a ler de frente pra trás, certeza).
 
Quero falar do que gosto, de amor ao próximo , de sentir as dores que não são suas , de se "colocar no lugar do outro. Já ia falar disso hoje e por coincidência li um artigo do site (https://www.consciousreminder.com) que nos questiona a respeito dessa  palavra que está atualmente nas redes , nos meios de comunicação, em toda parte : Empatia !
 
Será que somos seres "não egoístas" ? Por tanto que tem-se falado , será que entramos em um portal mágico e de repente , não mais que de repente , passamos a Viver em  uma nova era , a do "olhar pro outro" , de"se preocupar" , "se envolver" até mesmo na do "cuidar do que não é meu" ? 
 
Tenho minhas teses mas vim aqui trazer apenas o questionamento . Alguns deles eu proponho agora : Você aí se importa realmente com "as mulheres " , com o direito delas, nosso, com, o empoderamento , a questão da SoRoridade .. Ou isso só se aplica apenas com as mulheres que eu  e você conhecemos?  Uma estranha, uma famosa, um estrangeira, não é mulher? E quanto “mim” ou você militante dos direitos humanos.. É um tipo o que faço em prol da igualdade de direito e de tratamentos é aquela  que beneficia "os meus"? ; Quanto a desigualdade social quero oportunidade para todos, na teoria, lindo !  Mas na crise? Eu, você, buscamos o que ? Será que não exercemos a velha máxima  advinda da sabedoria popular : "farinha pouca meu pirão primeiro ?" Vamos pensar nisso ?
 
Empatia é ato moral mas é também exercício ! É se policiar a todo tempo , cuidando , se importando para não magoar o outro e lutando junto para todos termos a utópica igualdade de fato (e não apenas de direito) proclamada à exaustão na nossa tão perfeita Carta Magna de 1988 : A constituição ! 
 
"No meio do caminho tinha uma pedra, tinha uma pedra no meio do caminho.
Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho" 
 
Parece que “ele”previa que existiriam “pedras" em seu caminho inclusive "post mortem", assim como no caminho e rumos da humanidade que o poeta e cronista tanto amava e se preocupava . Drummond amava o povo , falava de sentimentos , era um lindo poeta ! 
Nobre Drummond receba minha  solidariedade , meu sentimento de empatia também , oras ! Arrancaram-lhe a vista , atacaram sua integridade , mas um órgão seu estará sempre vivo em sua obra!  Na sua história da sua vida que é contada  todos os anos . Triste daquele que nunca leu uma poesia de Carlos Drummond de Andrade. Ela é a iniciação , o ponto de partida nesse mundo colorido.  Junto com Cecilia Meireles foram meus primeiros contatos com a arte !
 
Enfim. Que o órgão, vivo, o coração dele , que siga incólume , intacto e pulsante ! 
 
Que o amor por ele propagado por meio a sua obra pulse para sempre em nossas veias brasileiras .
 
Vamos cuidar da estátua do poeta, vamos cuidar do amigo, do amor, do filho, vamos cuidar de nós mesmos!
 
Viva Drummond !
 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).