Daniel Costa
05/06/2020 11h25
UMA NOITE NO GRINGO'S
Na hora marcada, Maguila aparecia em seu táxi. Cinco minutos e eu já estava a atravessar a zona sul circundando o Campos Universitário até cair na Engenheiro Roberto Freire. O táxi acompanhava a procissão de carros que tomava o caminho dos bares e dos restaurantes de Ponta Negra, como acontece nas noites de sexta.
Os dias frios eram os melhores para se estar no Gringo’s. Quando eu subia o único degrau da porta de entrada, desviando a cabeça de um dos ventiladores laterais, Fernando fitava uma revista Piauí após ter emborcado nove ou dez long necks. "Vai de que hoje?", Weslley perguntava. E sem demora, baixava um Jack Daniel's da prateleira junto com uma porção de amendoins verdes.
Dali a pouco, armado com as novidades do circuito Petrópolis-Via Costeira, e com as notícias do último malogro do Flamengo, Xandão aparecia. Era como o start da noite, já que em seguida despontavam Orlando, Widson, Mia e N. Bruckner; cada qual com um punhado de histórias nascidas em outras capitais, prontas para saírem dos bolsos de suas calças jeans.
O frio aumentava fora do bar. Um shot de absinto sempre caía bem. A rapaziada, que sorvia alguns copos na calçada, lentamente ia entrando e preenchendo os espaços. Eram chuva, suor, cigarro e cerveja. Muito cigarro. Muita cerveja. Em algum momento, Jimi Hendrix parecia querer saltar do quadro, fixado na parede direita, pra terminar de queimar o baseado que pendia de sua boca. Zero hora. Joaquim, bem acompanhado de uma Samanaú, reverberava teorias foucaultianas.
Lá pelos fundos, perto do banheiro, Dani Sorriso se abria numa gargalhada, na companhia de Daniken, Mary, Carlos e Lea. O "ele" do balcão já se encontrava ocupado por figuras de todos os naipes; desde ébrios pouco confiáveis, até amantes de Bukowski, que destilavam suas célebres frases do tipo "o que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas vivem ou não vivem até suas mortes".
O barulho e a fumaça de Marlboro poderiam dar a impressão, para os não iniciados, de que uma pira de corpos estaria a ser queimada no centro do Gringo’s. As garrafas iluminadas, em conjunto com o logo vermelho chapado na máquina de Jagermeister, emprestavam um visual dégradé ao ambiente. Magão havia colocado pra tocar a sua melhor seleção de rock, incluindo The Clash e Dead Kennedys. E só saia da mesa de som pra esticar uma conversa com Alvinho, do outro lado da rua.
As bandeiras da Noruega e da Jamaica, que ficavam coladas no teto, obsevavam Arthur articular uma discussão sobre a psicologia barata de Woody Allen e o valor cinematográfico de Era Uma Vez no Oeste, arrebanhando, com isso, Abdenegon, Jozimar e provavelmente Hororroso, que dividia a mesa ao lado, com Cris e Sofie.
Gê Grilo e Júnior pilotavam os copos de drinks. E ajudavam a unir alguns desconhecidos, que sob o olhar de um cartão postal estampado com a imagem de Fidel Castro, esperavam a chance de um papo de balcão capaz de salvá-los da solidão dos que sofrem por amor. Já Valter, não sabia se ficava na mesa da esquerda, ou se ia pra mesa da direita, em que Cristianne acomodava os braços, com olhares enviesados, na companhia amiga de Luciano e de Renata. A essa hora, Hilberto tinha dado partida, puxando, na tranquilidade, o motor da Harley Davidson. E Radarani mostrava a Larica suas últimas tatuagens, depois de pedir a Caty um sex on the beach.
Game over. O sol começava a bocejar e Maguila conduzia de volta o seu táxi numa velocidade atenta, enquanto a névoa fina, que pairava nos contornos do Parque das Dunas, batia no para-brisa do carro parecendo com a fumaça do Gringo's Bar. Mas, claro, era só mais o fim de uma noite fria.
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).