Andreia Braz

18/07/2020 11h17
 
Lições de empreendedorismo
 
 
 
É tão difícil a gente caminhar
Quando uma estrada não está mais lá
E ter que construir o próprio chão
Com as incertezas que tiver
 
Mu Carvalho/Paulinho Moska
 
Estava decidida a sair de casa mais cedo naquele dia, porém alguns imprevistos atrasaram em pelo menos meia hora minha saída. Depois de concluir a revisão de uma monografia, responder alguns e-mails e analisar uma tese que havia recebido de última hora, achei que as atividades matinais estavam encerradas e que conseguiria chegar ao shopping ao meio-dia para almoçar com dois amigos. Bem, encerradas as atividades daquela manhã, eis que recebo mais dois trabalhos e decido conversar logo com os clientes para deixar tudo acertado. Afinal, à tarde teria outras atividades revisórias. 
 
Presumo que uma pessoa que procura um serviço dessa natureza geralmente tem urgência de ser atendida, sem contar que muitas vezes está fazendo uma pesquisa de mercado e o atendimento do revisor pode ser um diferencial na hora da escolha. Procuro ser o mais atenciosa possível quando alguém me procura para solicitar um serviço de revisão ou mesmo para colher informações sobre o meu trabalho.
 
Depois de conversar com os dois clientes, solicitei o serviço da Uber, o que tenho feito com certa frequência ultimamente, e fiquei aguardando alguns minutos, enquanto justificativa meu atraso para um dos amigos, por telefone, que já estava me aguardando para o almoço. Quando entrei no carro, já cumprimentando o motorista (Samuel), ele foi logo perguntando: “A senhora está indo trabalhar?”. “Não, estou indo almoçar com amigos”. Imediatamente, ele retrucou, bem-humorado: “Que chique!”. Expliquei que estava indo almoçar com alguns amigos com os quais me reunia com certa frequência, e suas observações deram início a um agradável bate-papo.
 
Falei de minha situação atual e disse que estava participando de um processo seletivo para revisor de textos cujo resultado deveria sair em breve. Quando lhe disse que atuo como profissional autônoma, ele falou da importância de abrir uma microempresa e das vantagens que se obtém com o CNPJ (Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica), sobretudo em relação à conta bancária e coisas do gênero, tais como empréstimos, por exemplo. Eu disse que estava pensando nisso há algum tempo e que o faria em breve.
 
Coincidentemente, ele acabara de fazer seu cadastro como microempreendedor individual e havia recebido a documentação no dia anterior, a qual mostrou-me com certo orgulho.
Quando falei da importância de ter um trabalho de carteira assinada, da segurança e das garantias legais desse tipo de atividade, ele argumentou que não temos a cultura de montar nosso próprio negócio e achamos que só dispõe de estabilidade quem trabalha de carteira assinada. “Não devemos acreditar nisso, porque trabalhando por conta própria jamais seremos demitidos”. Além disso, “trabalhando por conta própria, podemos pagar a previdência privada”, argumentou. Falou ainda da importância de acreditarmos em nossos sonhos, ressaltando que não devemos ter medo de enfrentar o novo e de lutar pelo que realmente desejamos. Explicou como devo fazer para abrir uma microempresa e as facilidades que posso alcançar com o CNPJ.
 
Essa conversa com Samuel me fez lembrar uma outra conversa importante (e definitiva) com meu amigo Nelson Patriota, há alguns meses, quando me disse que eu deveria investir mais na minha carreira como revisora, fazer cursos, me aperfeiçoar e abrir uma empresa de revisão e tradução. Na época eu estava um pouco desanimada com a concorrência dos concursos públicos e sem muitas perspectivas; estava relatando os investimentos em cursinhos, viagens para outros estados etc. Uma conversa que aliás foi um alento para quem vivia um momento de incertezas, mas, sobretudo, de recomeço. Havia sido demitida após quase três anos atuando como revisora em uma instituição federal, experiência que aliás me trouxe grandes aprendizados em vários sentidos. 
 
Sou muito grata por suas palavras, Nelson, e hoje percebo como elas foram imprescindíveis para que eu seguisse acreditando que seria possível recomeçar e trabalhar por conta própria até que surgisse uma nova oportunidade de emprego, o que está prestes a acontecer. Além de parceiro de trabalho e um grande amigo, você foi uma das primeiras pessoas que me incentivou a publicar minhas crônicas, e disso jamais vou esquecer. É meu revisor e também o melhor conselheiro quando o assunto é trabalho. 
 
Voltando ao assunto do almoço, não fosse aquele atraso jamais teria tomado o Uber com Samuel e, principalmente, não teria tido a oportunidade de escutar coisas tão importantes a respeito de novas oportunidades de trabalho. A verdade é que desci daquele carro muito mais feliz e confiante em mim mesma, após aquelas palavras de incentivo. Afinal, como diz a canção de Paulinho Moska: “Tudo o que acontece de ruim é para melhorar”. Quando cheguei ao shopping, fiquei pensando em como agradecer, novamente, por suas palavras, por isso resolvi escrever esta crônica; quem sabe um dia, ela chegue até Samuel.
 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).