Bia Crispim

20/11/2020 10h07
 
Segurem-se, o traviarcado está apenas começando!!!
 
 
Numa publicação feita em 20 de março desse ano, eu fiz a seguinte provocação:
 
“- O que uma pessoa trans pode ser? 
- O que ela quiser. Basta que ela tenha a oportunidade de se qualificar e a chance de ingressar no mercado de trabalho. 
 Parece bem simples, não é mesmo?!
 Porém, num país onde mais se matam transexuais e travestis no mundo*(ver nota de rodapé), onde a expectativa de vida dessa população é em média de 35 anos e onde a possibilidade de mais um dia na tentativa de sobreviver leva, no mínimo, 90% delas à prostituição, não é tão fácil assim.”
 
Pois bem, quero atualizar essa discussão, principalmente depois de um fim de semana eleitoral que presenteou o Brasil (sim, o Brasil!!!) com 29 pessoas trans eleitas para cargos públicos. Segundo a cineasta Renata Carvalho, estamos vivenciando um traviarcado. Pessoas trans e travestis cansaram de estar na condição de marginais porque uma parta (boa parte) da população assim pensou, quis e exigiu, nos invisibilizando.
 
Rebelamo-nos! A educação está nos salvando, nos empoderando. Está nos dando consciência, nos tornando PESSOAS, SUJEITOS e SUJEITAS sociais com direito à fala. Coisa que a sociedade insiste em dizer que não somos. Porém o saber está nos tirando da margem. Nossos gritos de liberdade ecoam e o sol brilha sobre nossas cabeças. Não nos escondemos mais durante o dia, nem nos revelamos somente à noite.
 
Somos, e estamos ocupando espaços. Na academia, na câmara, no comércio, na escola, na igreja, nos serviços, na moda, na estética, no cinema, nos esportes, no direito... Saímos das esquinas, estamos no centro. Estamos exigindo todos os holofotes sobre nós. Sobre nossas existências, sobre nosses corpes.
 
Podemos ser o que quisermos! Estamos criando nossas oportunidades e estamos chegando lá, pois nos apropriamos de nossas histórias, de nossas memórias, de nossas lutas... Não daremos nenhum passo para trás... Já temos nossos modelos, representatividades em todas as áreas... A estrada é longa demais e temos que caminhar, juntes...Sempre pra frente, festejando cada conquista, única e coletiva, ao mesmo tempo. Até que nossa presença na sociedade seja normatizada, até sermos tão cotidianes como café com pão, como feijão e arroz... Estamos nos inserindo e tirando de cima de nós a capa de invisibilidade com que nos cobriram... Ela se desgastou, se puiu, está em trapos, não nos serve mais. (Na verdade, nunca nos serviu.)
 
Estamos vivenciando uma revolução, uma evolução, uma TRANSformação. O traviarcado está alicerçando-se, não como forma de domínio, mas como possibilidade de existência legítima de nossas vidas. 
 
Tarde demais para tentarem nos calar, nos empurrar de novo para a sarjeta, nos tornarem “ninguéns”. Mesmo aqui, nesse sertão brabo, mesmo nesse Nordeste de cabras-machos, teremos uma Thábata Pimenta, radialista, aclamada como vereadora. Teremos Bia Crispim, professora, ocupando uma vaga de doutoranda na academia, assim como a saudosa Leilane Assunção o fizera.
 
Encontramos o caminho dos tijolos amarelos, aquele que nos leva às conquistas as quais almejamos para nós e para todas as manas travestis e pessoas trans. Potencializamos nossos cérebros, nossos corações pulsam por justiça e igualdade, e quanto à coragem, já nascemos com ela, por isso estamos aqui, a caminho do nosso OZ.
 
Segurem-se, o traviarcado está apenas começando!!!
 
*Por ocasião do Dia Internacional da Memória Trans, celebrado em 20 de novembro, a equipe do TvT?—?Transrespect versus Transphobia Worldwide publicou os resultados do “Observatório de Pessoas Trans Assassinadas Globalmente”, feito pela ONG Transgender Europe. De acordo com o boletim, o Brasil segue na liderança como o País que mais assassina transexuais em todo o mundo com 152 notificações, mantendo a posição pelo 12º ano consecutivo, desde que o projeto iniciou a pesquisa em 2008. (Retirado de https://midiabixa.com.br/pelo-12o-ano-consecutivo-brasil-e-o-pais-que-mais-mata-pessoas-transexuais/ - Acessado em 18-11-2020)
 
 

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