Eliade Pimentel

21/01/2021 08h31
 
Quanto será a durabilidade de um filho 
 
 
O escritor Mário Prata escreveu em suas célebres crônicas que filho é bom, mas dura muito. Quando você se dá conta dessa frase, é inevitável pensar na nossa condição de filho ou filha. Lembro-me de minha mãe morrendo aos 81 anos e me deparo com uma realidade: ela tinha oito filhos, cada qual com suas particularidades.  A maioria já crescido, muitos já não lhe davam as horas, mas tenho certeza se houvesse qualquer coisa, ela estaria ali, de ouvidos em pé, de olhos abertos, para saber o que estava se passando.
Me veio este assunto na mente hoje porque tenho uma filha, prestes a fazer 18 anos. Ela me deixou meio pensativa porque disse que eu a trato feito pré-adolescente, e isso seria o fator para que ela não aja como como uma pessoa crescida. Ou, uma jovem adulta. Enfim, ela deliberadamente criou uma situação para “culpar” quem é responsável pela criação e educação da mesma, ou seja, eu mesma. O fato é que pensei, será que é o achocolatado? Devo tirar das compras? Ou o miojo? 
 
Concluí que não seria suprimir um ou dois itens na lista que ia equilibrar essa difícil equação. Até quando e quanto devemos nos preocupar com essas criaturinhas, pelas quais fomos responsáveis em trazer a esse mundo? Para eles, ou para nós quando tivemos a mesma idade, é fácil dizer simplesmente: “não se preocupe comigo”. Acredito que eu também dizia isto para minha mãe. Mas, o fato é que nossos progenitores normalmente não escolhem esse caminho, o de se abster de preocupação. Já nascem com ela. Aliás, na hora que nascemos mães, ou pais. 
 
Saindo da minha filha, para ela não ter um treco – esse povo acha que os expomos demais, então vamos citar outros exemplos. Minha amiga, cuja filha já está com seus 23 anos. Ela reclamando do jeito meio indiferente da moça, meio malcriada, por melhor dizer, e eu: mulher, ela já tá bem crescida. Dá um gelo nessa menina, até que ouço: “pois é, já me disseram isso. Até o suco verde eu faço”. Apois, faça não.  Ou melhor, se você não for fazer o seu, então deixe de fazer este mimo e vá cuidar de si.    
 
Outras amigas, preocupam-se com empregos na intenção de colocar os filhos frente a frente com o mercado de trabalho. Nós, eu, e elas, na maior luta, e as crianças, como assim dizemos, às vezes, sem pensar, escolhendo o que fazer. Ou deixando passar oportunidades. Enfim. As coisas estão diferentes demais, hoje em dia. E temos consciência disso. Quando lembramos que com 18 anos nossos pais já estavam às vezes até com família para cuidar. 
 
Depois, conversando com um amigo que tem dois filhos adultos. Ele disse que fazemos muito por esse povo. “Imagino que um dos motivos é poupá-los das privações que passamos, e os enchemos de privilégios, de mimos”. O fato é que eu gostaria de saber fazer essa conta. Do quanto de privilégios devo retirar no sentido de fazer o meu bebê criar as próprias asas, já que estou emprestando as minhas para ela voar. 
 
Outra coisa que me pergunto quando me sinto culpada: qual é a dose de presença que devo oferecer. Na idade dela, eu não dependia emocionalmente de minha mãe. Não sentia necessidade de estar com ela, ver tevê com ela, ou fazer programas culturais. Ela era bem diferente de mim e eu preferia correr atrás da minha diversão. Hoje em dia, os psicólogos nos cobram que façamos coisas com nossos filhos. Mas, ninguém cobra a eles que façam coisas com suas mães ou com os pais. 
 
Chega um momento em que ficamos órfãos de filhos. Eles nos abandonam. Não querem fazer nada com a gente, são impacientes, chatos, nos fazem vergonha se não sabemos tudo de tecnologia. No entanto, os filhos não fazem mea culpa. Não estão nem aí, para saber como nos sentimos. E se somos mães solo, o vazio é maior ainda. Nunca estamos sossegados. A conta não fecha. Teremos sempre uma preocupação. Ainda que rejeitada ou criticada. 
 
A durabilidade de um filho é variável. Porém, não é o tempo de uma pilha comum, muito menos alcalina. A durabilidade de um filho é o tempo de nossa existência. Cada um de nós ao seu tempo. O tempo que temos disponível para eles ou elas. Como a nossa prole aproveita o tempo que dispensamos para eles é outra história. Eu quero durar bem muito, para acompanhar esse tempo da minha filha bem muito também. Quero vê-la realizada, feliz, me chamando de mamãe até eu ir embora desse plano, como se fosse a mesma garotinha de sempre. 
 
Mas, que aprendeu a acordar disposta a cumprir uma agenda de compromissos de uma mulher crescida, para aliviar o peso de uma mãe que não sabe até onde vai aguentar fazer essa mesma rotina. Que levanta para tirar as pedras do caminho e luta para enfrentar os obstáculos, que inevitavelmente vai encontrar pela frente. Que saiba rir dos problemas como um dia fomos obrigados a aprender, quando nos tornamos tão fortes como nossos pais, quando eram obrigados a passar por todos os percalços da vida para nos proteger. 
 
E assim caminha a humanidade, uma mãe que até um dia desses era filha, lutando com as quatro operações para saber como resolver a difícil conta que é saber até onde devo segurar a mão da minha filhota. Filho é bom, mas dura muito. Ufa. Ainda bem. Quero essa menina segurando a minha mão e dizendo: “mamãe, vista o casaco, está frio. Coma somente mais essa colherada. Não seja rebelde”. E que a gente viva todos os capítulos da série chamada vida em família. Vida de mãe e filha. Te amo, minha menina! Para sempre, meu bebê. 
 

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