Andrea Nogueira

03/04/2021 00h05
 
“Honra” no feminino e no masculino
 
No dicionário, HONRA significa privilégio. E numa definição mais ampla, significa “princípio que leva alguém a ter uma conduta proba, virtuosa, corajosa, e que lhe permite gozar de bom conceito junto à sociedade”.
 
A HONRA é abstrata. É uma virtude. E está atrelada a um comportamento humano. Mas o “comportamento humano” não é admitido igualmente para homens e mulheres. E agora?
 
A história deixa bem registrado que comportamento humano de homem e comportamento humano de mulher nunca foram igualmente admitidos pelo direito ou pela moral.
Durante muitas décadas, homens matavam mulheres ou lhes aplicavam castigos pelo simples fato de sentirem sua HONRA ferida. Doutra banda, não havia o que argumentar sobre a HONRA da mulher. Era como se realmente não existisse. Atos humanos praticados por homens ao longo dos anos como a traição em relacionamentos era tolerado e socialmente compreendido e justificado, enquanto as mulheres não podiam sequer ter a sombra da tentativa ou probabilidade de trair sobre seus ombros.
 
A sociedade adoecida seguiu. Homens honrados e mulheres sem honra continuaram suas trajetórias sem uma intervenção legislativa que os igualassem em direitos e deveres. Até que, em pleno ano 2021, o mundo testemunhou a Suprema Corte Brasileira firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra, para justificar crimes de homens contra mulheres, é inconstitucional.
 
Demorou.
 
Esse ano histórico para pessoas que lutam pela igualdade, faz lembrar a frase clichê: “a justiça tarda, mas não falha”. Mas a justiça falhou, pois chegou tarde.
 
O que temos agora é uma história para contar às próximas gerações. E não há como apagar os milhares de atos violentos cometidos contra mulheres em defesa da honra dos homens.
 
Certamente, uma situação análoga, mas estando a mulher na “posição honrosa” jamais chegaria à Suprema Corte. Simplesmente seria resolvida em primeira Instância e sem uma estrada tão longa em busca do direito à vida e do direito à liberdade. Uma mulher que matasse seu marido depois de uma traição já tem sua sentença definitiva em rápido
processo penal. E a sociedade também não deixaria que ela ousasse questionar sua tese de legitima defesa da honra perante o Supremo Tribunal Federal. Provavelmente nem haveria advogado para ir tão longe.
 
A que ponto chegamos...
 
Será que agora as pessoas vão acreditar que a HONRA também é uma virtude da mulher?
 
Ao meu ver, o conceito de HONRA é que desmoronou.
 
Do homem foi retirado o direito de arguir legítima defesa da sua honra para justificar a violência contra uma mulher. À mulher foi conferida a proteção quanto a este tipo de justificativa perante o Tribunal do Júri. Resta saber o que será da mulher antes do seu sofrimento chegar a um Tribunal do Júri.
 
A estrada é longa.
 

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