Daniel Costa

28/10/2021 08h55
 
PEC DA VINGANÇA OU MINISTÉRIO PÚBLICO DA MALDADE?
 
 
A proposta de Emenda Constitucional nº 5/2021, que prevê a alteração da composição do Conselho Nacional do Ministério Público, foi rejeitada pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Vários parlamentares mudaram rapidamente o discurso e se fizeram de desentendidos, depois que os membros do MP dobraram as mangas e se lançaram publicamente contra o texto substitutivo apresentado pelo deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), que pretendia aumentar o número de conselheiros indicados pelo Congresso e interferir na escolha do Corregedor Nacional do CNMP.  
 
Embora a PEC 5 tenha sido rejeitada, ela ainda não foi sepultada, devendo retornar ao Plenário da Câmara para a análise da sua versão original. Seja como for, independentemente do que vier a acontecer, a questão de fundo se afigura de interesse geral: é realmente necessária uma fiscalização mais efetiva das atividades dos membros do ministério público, ou tudo não passa de uma maquinação política para fustigar o combate à corrupção, como dizem os representantes do parquet?
 
O primeiro ponto a ser considerado é que a fiscalização da atuação do MP, pela própria instituição, vai mesmo de ruim a terrível. É sintomática, nesse sentido, a ausência de punição de praticamente todos os procuradores que atuaram no processo da Operação Lava Jato. O corporativismo deu a cor das tintas, mesmo diante das acachapantes irregularidades cometidas por alguns deles, que implicaram inconcebível intromissão no resultado das últimas eleições presidenciais. O que não é pouca bobagem, venhamos e convenhamos.
 
Daí já ser possível concluir que mudanças são realmente necessárias. Até mesmo porque dentro do Estado democrático de direito, nenhum órgão deve atuar como sendo o dono da terra e da lua. As suas ações precisam ser controladas como manda o figurino do sistema de fiscalização recíproca. O que nos leva a um segundo questionamento: a mudança sugerida por meio da chamada “PEC da vingança” é o melhor caminho?
 
A proposta articulada está bem longe de ser uma boa solução. Na verdade, nos termos em que formulado seu texto, ela seria uma espécie de cavalo de troia pronto para invadir a função fiscalizadora do CNMP, entregando aos parlamentares poderes suficientes para fazer do órgão um balcão de fisiologismo propício aos desvios de sempre.
 
Mas então qual seria a solução para conter os abusos de procuradores da estirpe de Deltan Dallagnol? A saída deve passar pela reformulação da composição dos membros do Conselho, mas não da maneira como indicada pela PEC 5. O primeiro passo seria enfraquecer o esprit de corps, diminuindo o número de conselheiros provenientes do Ministério Público, com a sua substituição por componentes nativos da OAB, dos tribunais regionais federais e do STJ. Depois, se elevaria o nível de imparcialidade vedando-se a escolha de corregedor oriundo das hostes do MP. Se por um lado, isso geraria o problema de se ter um corregedor pouco calejado nas nuances do funcionamento do Ministério Público, por outro, o controle social ganharia outro nível de eficácia. E nesse caso, no final das contas, longe da PEC da vingança e do Ministério Público da maldade, ter-se-ia uma democracia mais fortalecida.  
 

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