Renato Moraes

19/01/2022 09h52

 

Missa em latim e lendas urbanas na Cidade Alta

Para quem gosta de ritos tradicionais, a nossa dica de hoje é um tour pela Cidade Alta. Aos domingos, na igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, tem Missa Tridentina, rezada no rito romano, com trechos em latim. Construída por escravos, a igreja é o segundo templo católico mais antigo de Natal, fincada na história da cidade como um marco de fé e resistência. Foi finalizada entre 1713 e 1714, de acordo o mestre Câmara Cascudo.

Mas essa história começa há mais de 500 anos. A devoção a Nossa Senhora do Rosário tem sua origem entre os dominicanos, por volta de 1200. São Domingos de Gusmão, inspirado pela Virgem Maria, deu ao rosário sua forma atual. 

A primeira Irmandade do Rosário foi instituída pelos dominicanos em Colônia (Alemanha), em 1408. Logo a devoção se propagou, sendo levada também por missionários portugueses ao reino do Congo. A irmandade chegou ao Brasil no século 16. No Brasil-colônia, a Igreja Católica, sempre de portas abertas para novos fieis, permitiu a criação de irmandades e igrejas consagradas aos negros, impedidos de frequentar as mesmas igrejas de seus senhores.

E assim, junto com São Benedito, Nossa Senhora do Rosário tornou-se também santa de devoção dos negros. No caso da santa, uma das teorias é que os escravos recolhiam as sementes de um capim, cujas contas são grossas, denominadas "Lágrimas de Nossa Senhora", e montavam terços para rezar.

A partir do fim do período colonial, as irmandades do Rosário passam a ser constituídas pelos "homens pretos". Em Natal, essa conexão foi se perdendo ao longo da história e os registros da irmandade estão mais visíveis no interior do RN, na região do Seridó.

Ainda para quem gosta de conhecer um pouco mais sobre os cantos que carregam a história – e lendas urbanas - da cidade, bem ao lado da igreja tem outra relíquia histórica, a casa da viúva Machado. Foi construída em 1910 por Jorge Maranhão, irmão do governador Alberto Maranhão. Na sua construção foram utilizados os melhores materiais e peças artísticas trazidas da Europa.

Em 1920, a casa foi vendida ao rico comerciante Manuel Machado. Com a morte dele, a casa passa a ser ocupada pela viúva, Amélia Machado, que pouco saía de casa. Daí surgiu a lenda de que a viúva sequestrava crianças para lhes roubar e comer o fígado, em uma adaptação local do mito do papafigo. Em virtude desses boatos, a viúva se isolava ainda mais, até sua morte, em 1981. 

A Cidade Alta é lugar de tradição e história, mas também tem lá suas lendas urbanas. 

 

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