Fábio de Oliveira

14/02/2022 09h52

 

É uma mão de obra qualificada de que precisamos?

Mesmo não sendo efetivamente minha área de atuação, na semana passada participei de um evento pedagógico do Estado do RN. Antes da ocasião, pus-me a pensar sobre quais perspectivas educacionais são tratadas nesses eventos. Haja vista o modelo de escola que estudei e alguns acompanhamentos que venho percebendo, dos quais não houve mudanças, de fato, significativas nos dias de hoje.

O evento em questão foi a Jornada Pedagógica que ocorreu na Escola do Governo, com a temática “Desafios da Educação Potiguar: ressignificando saberes e práticas para a garantia do direito à inclusão, permanência e aprendizagem”. Algumas indagações vieram à mente sobre para quem seria voltada essa temática e como seria essa ressignificação proposta no título. Mas preferi não continuar alimentando essa dúvida e deixei-a para outro momento.

Depois de cruzar em passos lentos o Centro Administrativo, cheguei ao local no horário marcado para apresentação do projeto Gamboa do Jaguaribe, do qual eu participo desde 2017, junto com Jaguar. A ideia foi apresentar nosso trabalho tendo como base as leis 11645/08, 9795/99 e 13666/18, que tratam respectivamente do ensino das histórias e culturas afro-brasileiras e indígenas, educação ambiental e alimentar.

Enquanto aguardávamos o nosso momento de fala, assistimos a um trecho de uma das apresentações sobre distintas e não tão variadas oportunidades de formações, por meio de alguns programas de qualificações do governo em algumas escolas. Estudos que são realizados dentro da Educação Profissional e Tecnológica (EPT), uma modalidade educacional prevista na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) que tem o intuito principal de preparar o estudante para o mercado de trabalho.

Momentaneamente fiquei um pouco surpreso com algumas informações apresentadas e as diversas possibilidades de formações que, de uma delas, até participei em 2014, quando estudava na área de tecnologia de informação. Mas no final — e digo por experiência própria —, direcionam tudo para uma qualificação de mão de obra ausente de um olhar crítico às circunstâncias políticas e sociais ao redor. É uma preparação profissional aos moldes iluministas e da revolução industrial.

Durante a apresentação, alguém sentado no fundo do auditório levantou a mão no momento de perguntas: “Como o estudante que passa o dia trabalhando conseguirá chegar às 18h30 na aula se ele só chega às 19h, além de um dia exaustivo?”, perguntou a participante. Esse foi um importante aspecto social levantado em questionamento que provavelmente não são levados em consideração nesses programas de formações.

Muitos estudantes, principalmente os que moram na zona rural, passam o dia lutando pelo seu sustento e à noite ainda precisam ter disposição para se dedicarem a sua formação e qualificação. Lembro-me de uma escola na zona rural em que realizei oficinas. Muitos estudantes se esforçavam para terminar os estudos pelo EJA, mas a evasão ainda era alta justamente por aqueles motivos.

Quando se fala em estudos e conhecimentos, não existe um só caminho. Limitar-nos a um cenário de produtividade incansável e remuneração que iludem para uma vida “bem-sucedida”, é desconsiderar outras formações e estudos possíveis. Principalmente discussões mais emergentes que deveriam ser basilares na educação sobre raça, etnia, gênero, sociais e tantos outros marcadores que nos atravessam.

Não estou dizendo que os conhecimentos nas formações da área tecnológica promovidos pelo programa EPT e suas diretrizes não são importantes. Mas tão importante quanto, é a efetividade da praticidade das leis educacionais que fortalecem os povos indígenas, negres, quilombolas, ciganes e tantos outros povos que são maioria nas escolas municipais e estaduais. Mas são subalternizados nesse sistema colonial pela ausência de diálogos e ações.

 

 

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