Fábio de Oliveira

13/06/2022 09h52

 

Redirecionando os diálogos

Fala-se tanto em sustentabilidade e diversidades na academia, nos movimentos culturais, mesas de debates e dentre outros locais coletivos. Percebo que o uso dessas temáticas em títulos, objetivos, justificativas de projetos e eventos não passam de meras palavras para preencher lacunas de documentações e diálogos que não se concretizam em ações efetivas de retorno às comunidades. As mentes colonizadas fazem “ouvidos de mercador”, pois é mais conveniente lucrar e/ou ganhar titulações às nossas custas. Cheguei a um momento que direciono meu tempo e energia para falar para quem quer realmente ouvir.

Em princípio, é importante destacar que as minhas escritas aqui nesta coluna não baseiam-se em opiniões nem tão pouco no achismo. Estudos, pesquisas e vivências fazem parte não somente da minha oralidade e dos meus processos de escrita, mas também das minhas criações imagéticas na fotografia, nos podcasts e nos documentários que realizo.

Eu não crio a expectativa de que você, leitore, compreenda instantaneamente e trace sentidos em uma comparação com a realidade ao seu redor. Afinal, não fomos e nem somos ensinados a extrair o colonizador que há dentro de nós. Tudo isso são processos reflexivos políticos e sociais dos quais nem todes estão dispostos a encarar.

Em ano eleitoral essas temáticas sempre estão nos discursos de candidatos de todos os partidos, os quais acabam utilizando causas e contextos como palanques eleitorais para conseguirem votos. Mas é perceptível a ausência de importância antes e depois dos seus mandatos. Não é de agora que ativistas ambientais e indígenas vêm tentando dialogar para que políticas públicas e direitos constitucionais saiam do papel e sejam realmente efetivados.

Já no ambiente cultural, em todos os eixos artísticos, o que vemos é majoritariamente pessoas brancas ocuparem e dominarem os cenários. Em diálogos desgastantes em fóruns, assembleias e quaisquer outros tipos de reunião para construções coletivas – inclusivas e afirmativas –, quando entramos, somos como meras cotas. As reivindicações por reparações históricas feitas por pessoas indígenas, negres, ciganes, quilombolas e demais grupos acêntricos são vistas como uma loucura de quem quer subverter a ordem. Além das pessoas brancas, há negros e indígenas que agem como brancos e não se reconhecem social e politicamente, alimentam cada vez mais os ideais colonizadores.

Os diálogos sobre uma perspectiva decolonial precisam chegar às escolas e às comunidades negligenciadas pelo Poder Público. Pois são crianças, adultos e idosos – que são indígenas, negres, ciganos e de terreiro – que não têm acessos a esses debates. E são justamente essas pessoas que continuarão ensinamentos e as ações para adiar o fim do mundo, como preconizado por Ailton Krenak.

Eu não dispenso mais energia e tempo com políticos, intelectuais, escritores, realizadores audiovisuais e tantos outros que não estão dispostos a ouvir as narrativas como de fato aconteceram, aliados aos interesses antagônicos às necessidades das comunidades oprimidas pelo sistema. Aquele ditado de que o pior cego é o que não quer ver, representa bem a situação.

 

           

           

 


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