Fábio de Oliveira

20/06/2022 07h54
 
Desacelerar para viver
 
O ritmo acelerado e as adversidades diárias nos colocam frequentemente em situações de descuido com nós mesmos: a ausência de tempo para sairmos minimamente de um sedentarismo normalizado e o mau hábito diário em consumir uma alimentação ultraprocessada, da qual danifica nosso organismo a um longo prazo. Além dessas situações cotidianas, não há como não deixar-nos afetar por complicadas relações interpessoais, racismo, machismo, homofobia e dentre outras formas de opressões, das quais temos que suportar e lutar.
 
São tantos movimentos e buscas por soluções para tão pouco tempo, que 24 horas parecem até serem poucas para um dia. Sutilmente nossa imunidade, em todos os sentidos, vai se abatendo. E ainda tem aquela sensação de estarmos sempre atrasados, passados para trás e com uma pilha de demandas para resolver. Então, como desacelerar esse ritmo para sairmos de uma condição de sobrevivência?
 
É fundamental compreendermos e nos situarmos na sociedade em que vivemos. Há realidades muito distintas umas das outras e cheias de interseccionalidades: étnica, racial, gênero e social. Contextos e rotinas que se atravessam para manter um modo de vida cada vez mais opressor e de valores invertidos. As conjunturas políticas e econômicas atuais exercem influências e pressões significativas no nosso cotidiano.
 
Na cidade, muitos estão em um modo automatizado de vida. As pessoas estão ocupando cargos subalternizados para enriquecer mais ainda a classe burguesa, trabalhando cerca de 12 horas por dia e só chegam em casa para descansar e fazer tudo de novo no dia seguinte – por um salário-mínimo. Um ciclo contínuo sem tempo para refletir e questionar sobre que dinâmica é essa de existência com direito, talvez, a um dia de folga a cada 6 dias trabalhados e férias parceladas. 
 
Ainda em um âmbito urbano, a falta de oportunidade de um emprego e moradia digna colocam muitos em outro modo de sobrevivência, tentando conseguir o mínimo que está ao alcance em trabalhos informais, quando surgem. E, no pior das reais situações, sobrevivendo sem condições mínimas, à deriva diante da “omissão” do Poder Público em diversos aspectos.
 
Já em outros municípios nos centros e nas zonas rurais as dinâmicas são semelhantes. Mesmo garantidas na Constituição de 1988, nossos povos lutam pela efetividade de políticas públicas que garantem, de fato, terras demarcadas, saúde e educação diferenciadas. Em paralelo a isto, acontecem outros meios de coexistências que são diversos e desafiadores. 
 
Tantas são as situações e realidades que acontecem ao nosso redor, que não cabem elencá-las em tão poucas linhas. Diante de constantes violências em contínuos fluxos de um modo de vida sempre acelerado, as nossas subjetividades e nosso autocuidado acabam ficando em último plano ou até fora de cogitação.
 
Não tomando um partido conformista, mas o que acaba restando é um meio de sobrevivência que, aos poucos, nos degradam em vários aspectos. Eu não consigo normalizar esse modus operandi de existir. Nós somos encurralados sistematicamente por essa forma de vida imposta e que atravessa as gerações, moldando cada vez mais complexas e restritas dinâmicas internas e sociais. 
 
Não há um manual para mudar essa realidade comum a todes: ao passo que também é coletivo, é algo peculiar a cada corpo e mente. Mas acredito, não de forma utópica, em possibilidades com reais efeitos a longa data de o nosso autocuidado ser valorizado e priorizado por nós mesmos.
 
 
 

 


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