Cantor, compositor, escritor e produtor cultural. Formado em Gestão Pública, apresenta programa Talento Potiguar, aos sábados, às 8:30 na TV Ponta Negra, afiliada do SBT no RN.
TER SÓ TALENTO NÃO É TUDO
Nestes meus quase cinquenta anos de estrada na Música, eu me acostumei a ver muitos artistas talentosos não saírem do anonimato e outros nem tão talentosos assim, obterem sucesso. Isto sempre aconteceu, mas agora, com o avanço da tecnologia, com o fim das gravadoras, com o fenômeno das redes sociais e com a disputa cada vez mais acirrada no mercado de trabalho, ter apenas talento para se projetar no mundo da música – ou de qualquer outra manifestação artística - se tornou cada vez menos importante. Infelizmente não se pode negar esta realidade.
Antigamente – pelo menos até o final do século passado - um artista que quisesse se projetar como cantor ou cantora tinha que ser talentoso(a) e obstinado(a) na busca pela conquista do sucesso. Muitos ficavam no meio do caminho porque, embora talentosos, não tinham espírito de competitividade e nem disposição para a luta e por isso eram passados para trás por concorrentes que, embora com menos dotes artísticos, tinham mais coragem e determinação.
Até o início da década de 80, com raras exceções, a entrada de alguém no mundo da música obedecia mais ou menos a um padrão que compreendia as seguintes etapas: 1) O candidato a cantor ou cantora começava se projetando em um programa de calouros, como crooner de um grupo musical ou orquestra, ou ainda cantando na noite para sobreviver; 2) Com a projeção conquistada, travava conhecimento com pessoas importantes; 3) A partir daí, podia ser descoberto por algum produtor que o(a) levava para uma gravadora; 4) Quando isto ocorria, assinava um contrato para a gravação de, no mínimo um disco, geralmente um compacto simples (disco com duas musicas); 5) Dependendo da repercussão deste compacto simples, gravava um compacto duplo (disco com 4 músicas) e se este segundo disco fizesse sucesso, gravava o seu primeiro LP. Pronto: aí o artista já estava inserido no meio artístico.
Eu mesmo tive a sorte de passar por todo este aprendizado: fiz parte de uma banda de baile nos anos setenta (Apaches, de Natal, de 1969 a 1973), ganhei concursos em programas de TV (Calouro Exportação na Buzina do Chacrinha na extinta TV Tupi em 1974) e Melhor Intérprete de Roberto Carlos (na Buzina do Chacrinha, que na época ia ao ar pela na TV Bandeirantes, em 1979), cantei na noite (no Rio de Janeiro, de 1975 a 1980) e gravei dois compactos simples, vários LP’s, CD’s e dois DVD’s.
Com tempo, aprendi que, depois de gravar o primeiro disco, qualquer artista está apenas começando a escrever sua história; a partir daí, embora já esteja inserido no mercado fonográfico e seja conhecido do público, o caminho para o sucesso está só no início; depois da gravação do primeiro disco, o artista, talentoso ou não, para sua gravadora, é apenas um produto.
Até meados dos anos 90, muitos artistas não entendiam sua posição no mundo da música. Ignorando – ou fingindo ignorar – que eram vistos apenas como uma mercadoria que precisava dar lucro à gravadora, artistas muito talentosos começavam a perder espaço para artistas apenas razoavelmente talentosos, porque, muitas vezes estes eram mais dedicados à divulgação dos seus discos do que aqueles. E a quem a indústria fonográfica, ávida de lucro, dava prioridade? Ao verdadeiramente talentoso – mas acomodado - que muitas vezes dava prejuízo, ou ao apenas razoavelmente talentoso, - mas batalhador e obstinado - que dava lucro? Nem é preciso responder...
Hoje, com a tecnologia ao alcance de todos, os talentosos ainda têm um desafio a mais: para sobreviverem como artistas num mercado cada vez mais competitivo, também precisam estar antenados com as facilidades que o avanço tecnológico proporciona e, principalmente saber usar estas facilidades para divulgar maciçamente seu trabalho.
As gravações de compactos, LP’s, CD’s e DVD’s são coisas do passado. Hoje, estamos vivendo a época dos EP’s, dos videoclipes, dos stories e qualquer cantor ou cantora, de qualquer estilo, em qualquer lugar do mundo pode, com uma simples postagem sair do anonimato e ficar famoso em pouquíssimo tempo, bastando para isto conquistar milhares de seguidores nas redes sociais, independente das suas aptidões artísticas, do tamanho do seu talento e do seu estilo musical. Deste modo, muitos artistas de talento continuam a perder espaço para artistas não tão talentosos assim. Com tantas mudanças, eu pergunto: nos dias de hoje, para quem as portas do sucesso estão abertas? Para quem tem talento, mas não consegue ser competitivo, ou para quem não tem talento – ou é apenas razoavelmente talentoso - mas tem mais poder de articulação e sabe usar bem as redes sociais? Eu me atrevo a responder a esta pergunta: hoje em dia, o mercado de trabalho e as portas do sucesso estão abertas para quem sabe usar com competência as redes sociais; por isso, mais do que nunca, em se tratando de música, nos dias de hoje, ter só talento não é tudo.
Instagram: @fernandoluizcantor
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