Fernando Luiz

05/05/2024 05h51
 
TRECHOS DE MÚSICAS CLÁSSICAS INSERDOS EM MÚSICAS ROMÂNTICAS 
 
Em 1969, Antônio Marcos lançou um LP com a música Você Pediu e Eu Já Vou Daqui, que fez um grande sucesso. Ao ouvir a canção pela primeira vez, fique com a impressão de que a introdução da música  não me era estranha: eu já tinha escutado “aquilo” em algum lugar. Três anos depois, aconteceu algo parecido, quando escutei pela primeira vez a música  If You Cold Remember, de um certo Tony Stevens, do qual eu nunca tinha ouvido falar. No mesmo ano, aconteceu de novo. Eu apresentava o programa Nordeste, das Cinco a Melhor, na rádio Nordeste, das 14 às 16 horas e uma das músicas mais pedidas pelos ouvintes por carta e telefone era Mon Amour, Meu Bem, Ma Femme, de Reginaldo Rossi. No solo do meio havia uma melodia que não me era estranha. O mistério de desfez quando o conjunto Apaches, do qual eu era crooner, estava tocando em uma festa no Pax Clube de Macaíba.
 
João de Orestes, fundador e líder do conjunto, havia me dado liberdade para inserir no repertório do conjunto alguns sucessos de cantores populares, o que era um verdadeiro sacrilégio para os conjuntos da época, cujos repertórios eram compostos por sucessos nacionais e internacionais. Com a permissão de João, eu inseria ocasionalmente no repertório músicas de cantores populares como Jerry Adriani, Nelson Ned, o próprio Reginaldo Rossi e alguns outros.
 
Num dia em  que o conjunto  Apaches tocava  no Pax Clube de Macaíba eu cantei Mon Amour Ma Femme. Por coincidência estava na festa um fã dos Apaches que era professor de francês. No intervalo do baile, ele veio ao meu encontro e me perguntou se eu sabia que o solo do meio daquela música era a melodia de uma canção gravada em 1946 por Edith Piaf. Eu não sabia, mas naquele momento aprendi que o solo do meio daquela música de Reginaldo Rossi era um trecho da canção La Vie En Rose, um clássico mundial, que Rossi (ou seu produtor) havia incluído no arranjo da música.
 
Em 1975, o fato curioso se repetiu mais uma vez, quando escutei a música  Velhos Tempos do paraibano Bartô Galeno, que nasceu em Souza, na Paraíba, mas que muita gente pensa que é mossoroense; agora, além de Você Pediu e Eu Já Vou Daqui, Velhos  Tempos também chamou minha atenção, pois eu tinha certeza que já havia escutado a introdução daquela música antes. Minha dúvida durou vários anos...
 
Quando gravei Garotinha e passei a viajar por vários estados brasileiros fazendo shows e divulgando meus discos, no contato com divulgadores, cantores, discotecários, radialistas e empresários artísticos de várias regiões do país, passei a conhecer inúmeras  histórias dos bastidores do mundo da música. Descobri que a canção Don’t Let Me Cry foi gravada por Fábio Junior com o pseudônimo de Mark Davis; descobri também que o cantor Steve MacLean era o produtor paulista Hélio Costa Manso (que fez um grande sucesso em 1975 com a música True Love); de quebra, descobri que existiam cantores que não cantavam no ritmo (o que os obrigava a gravar seus discos ouvindo um  voz guia colocada por quem realmente cantava). Com relação às músicas de Antônio Marcos e Bartô Galeno citadas anteriormente, só algum tempo depois o mistério se desfez.
 
Nos anos 90 a revista Caras lançou uma série de cd’s de músicas clássicas. Comprei todos.  Foi então que minhas dúvidas começaram a se dissipar. Ouvindo um dos cd’s descobri que o acorde utilizado na introdução da música Você Pediu e Eu Já Vou Daqui, gravada por Antônio Marcos era um trecho da Ária da 4ª corda de Bach. 
 
Há alguns anos, numa conversa que tive com Carlos André, em Fortaleza, ele me disse que a ideia de colocar uma introdução “diferente” na música Velhos Tempos, gravada por Bartô Galeno, foi do maestro Pachequinho, arranjador da maioria dos discos de Bartô; ele me disse que a  introdução da música é um início do Concerto de Aranjuez, do compositor espanhol Joaquin Rodrigo.
 
Pessoalmente eu tive o “atrevimento” de fazer algo parecido em uma música minha dentro do meu estilo. Em 1987, compus um brega chamado Aliança Dourada, que gravei no meu terceiro LP, lançado em 1987. Como introdução usei literalmente um trecho de A Noiva, sucesso de Agnaldo Timóteo. No estúdio o produtor do LP, Manoel Cordeiro introduziu, no oitavo compasso, um solo de teclado ao fundo, com um fragmento do Noturno de Chopin.  Desta forma, pude usar um pouco de criatividade ao inserir fragmentos de uma música clássica numa música  brega de minha  autoria.
OBS: As musicas aqui citadas estão disponíveis no Youtube 
 
Fernando Luiz é cantor, compositor, apresentador e produtor cultural.
Instagram: @fernandoluizcantor
 
 
 
 
 

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