Mestre em Estudos Urbanos e Regionais, ex-vereador de Natal/RN pelo PCdoB, é Diretor Autárquico da ARSEP e autor de livros sobre metrópoles e saneamento básico.
CIDADES PARA AS PESSOAS
Ao olharmos superficialmente a crise atual que enfrentam as cidades e metrópoles brasileiras – a chamada crise urbana – somos levados a pensar que se trata de um fenômeno isolado e que não guarda conexão com outras graves questões que se expressam no âmbito desse mencionado território, em nosso país.
Ao mesmo tempo, chegamos também a pensar que as soluções para os problemas aí identificados serão produto de iniciativas e ações circunscritas ao contexto urbano e metropolitano, tão somente na dimensão físico-territorial, desconectadas de outras esferas da vida em sociedade.
Será que o grande e crescente número de pobres, de desempregados, de sub-empregados, de moradias em favelas e em cortiços, a falta de cobertura de saneamento básico e de transporte público, a exacerbação da violência e outras chagas, tudo isto que vem alimentando incertezas acerca do futuro das grandes cidades brasileiras, está dissociado?
É evidente a necessidade de uma Reforma Urbana que garanta direitos e serviços ao povo, como moradia digna e infraestrutura, saneamento ambiental, transporte público com ênfase no transporte coletivo, mobilidade urbana, segurança pública, cultura, esporte e lazer, entre outros.
O poder público, em seus três níveis de abrangência, segundo estabelece a Constituição Federal, está obrigado a garantir o planejamento urbano democrático e a aplicação dos dispositivos constitucionais e legais como a função social da propriedade, conforme o Estatuto da Cidade, e construir o Sistema Nacional de Política Urbana.
Mas a ação do poder público, se não tiver o foco nas causas, e não apenas nos efeitos dessa problemática, certamente não obterá o êxito necessário para cuidar do bem-estar das pessoas, para usar a terminologia encontrada na Carta Magna e no Estatuto da Cidade.
Para cumprir tais propósitos, há que se romper com a lógica rentista que beneficia apenas os bancos e os especuladores, diante de um modelo em que parcela significativa das riquezas produzidas pelo povo brasileiro fica nas mãos do grande capital. Sob tais relações de dependência, é impossível destinar recursos para elevar a qualidade de vida nas cidades e metrópoles, em favor de suas populações.
De onde se vai tirar dinheiro para promover a cobertura do acesso universalizado ao saneamento básico? E para o enfrentamento ao deficit habitacional? Como se vão construir obras de infraestrutura em mobilidade urbana e nos respectivos sistemas integrados de transportes nas metrópoles?
A pobreza, a miséria e a exclusão social, tão presentes nas grandes cidades brasileiras, são, na verdade, produto do modelo excludente em curso. Numa sociedade marcada por um quadro tão perverso, as cidades não poderão ser o locus da alegria, da prosperidade e da satisfação das pessoas.
O caminho para a superação dessas mazelas não será trilhado apenas pela resposta à crise urbana. E sim pela implementação de um Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento, que, para o Professor Wilson Cano, “deveria ter, como vetor político central, o ataque frontal a nossas desigualdades maiores e uma verdadeira estratégia de retomada da industrialização, com vista a um crescimento econômico mais bem ambientalmente sustentado (*).
O financiamento de tal projeto terá de vir da enorme riqueza gerada pelo próprio povo brasileiro, mas que permanece apropriada por uma pequena minoria de ricos.
Somente assim, pode-se oferecer às pessoas, no campo e nas cidades, um ciclo civilizacional capaz de apontar para o atendimento à verdadeira vocação da humanidade: uma vida digna, com progresso social e solidariedade!
(*) CANO, Wilson. Ensaios sobre a crise urbana do Brasil. Editora da Unicamp, 2011, pág. 358.
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).