José Antônio Aquino
01/03/2018 10h29
Nos últimos dias o Brasil foi surpreendido com a notícia da intervenção federal na gestão da segurança pública no Rio de Janeiro ao mesmo tempo em que o próprio Governo Federal alardeou a criação do Ministério da Segurança Pública. O que realmente isso significa?
Diante do inegável caos do quadro político institucional que o País atravessa, inúmeras foram as opiniões imediatamente formadas acerca de tais medidas. Por um lado, os simpatizantes do Governo Temer, apoiaram a medida intervencionista como sendo uma alternativa ao atual quadro de insegurança pública enfrentado pelos cariocas. Por outro, alguns oposicionistas fincaram pé contrários à medida e viram ali até uma ameaça à democracia.
Contudo, é muito importante que consigamos ver além das paixões políticas, de modo a compreendermos o que efetivamente está ocorrendo e aonde nos levarão tais medidas governamentais.
O Governo Federal apresentou dados de um “impressionante” crescimento da taxa de mortalidade que assola aquele estado; Segundo o Instituto de Segurança Pública – ISP – Órgão do governo fluminense, ressalte-se, entre 2012 e 2017 houve um crescimento de tal índice da ordem de 41,84% passando de 28,2 para 40,0 homicídios por cada 100.000 habitantes.
Ora, se esses índices estão corretos e a justificativa realmente fora essa, existe um questionamento elementar: Por que tal intervenção não ocorrera em outros estados do País que apresentam índices vergonhosamente maiores? No Rio Grande do Norte, por exemplo, segundo dados do Observatório da Violência Letal Intencional – OBVIO, a referida taxa de mortes atingiu em 2017 a impressionante marca de 68,66 assassinatos para cada grupo de cem mil potiguares, uma taxa 64,10 % maior que a registrada no estado carioca.
Nunca é demais lembrar que a Organização das Nações Unidas tem por referência como aceitável a taxa de 10 mortes matadas a cada grupo de cem mil habitantes na área analisada. Vivemos o caos em nosso País.
Observando tais dados, fica claro que, a intervenção na segurança pública no Rio de Janeiro, ocorreu tão somente por questões políticas. Seja porque o Governo Federal queria tirar o foco da explícita derrocada do projeto da reforma previdenciária no parlamento, seja por tentar trazer as atenções da sociedade brasileira para um possível grande feito de sua gestão, o que lhe traria dividendos políticos: A pacificação da capital Fluminense, fato pouco provável que ocorra de forma definitiva.
De certo modo a intervenção federal, com o exército ocupando as ruas da cidade cartão postal do Brasil, além da natural simbologia, apresenta um fato inconteste: Estima-se que o exército atuará até com 50.000 homens realizando um patrulhamento ostensivo nas ruas da cidade fluminense. Muito facilmente se depreende que essa reles ação reprimirá o chamado crime mais simples: Decerto que assaltos e pequenos furtos serão reduzidos, isso é um natural reflexo de uma ação ostensiva desse porte. Todavia, é importante ressaltar que a aparente calma momentânea não significará que o crime propriamente dito estará sendo confrontado. É sabido por quase todos os operadores de segurança pública que uma atuação ostensiva sem o fundamental aporte de uma investigação policial, de nada, ou muito pouco, adiantará. E aqui se tem um problema grande.
A atuação do Exército nas ruas, realizando seu nem tão novo, mas provisório, mister não passará de reles factoide político, uma vez que os reais motivos fomentadores do grande caos de insegurança pública que assola o país, nem de longe estará sendo enfrentado: Falta de políticas sociais inclusivas e reformulação completa do atual improdutivo modelo de persecução penal, que inicia na atuação Policial e vai até a ação do Poder Judiciário.
Por outro lado, no mesmo diapasão, a busca por uma solução para a grave crise de insegurança pública sob a qual perece a sociedade brasileira, eis que o Governo Federal sugere a criação do Ministério da Segurança Pública.
É importante lembrar que muito recentemente o Comandante do Exército teceu um comentário forte acerca de sua percepção sobre o atual modelo de segurança pública no Brasil, quando foi mais uma vez convocado a atuar nas terras potiguares: “Em um ano e meio, fomos empregados três vezes no Rio Grande do Norte e, nesse espaço de tempo, não houve nenhuma modificação estrutural no sistema de segurança pública naquele estado. E nós sabemos que logo seremos chamados a intervir novamente”. É importante complementar essa colocação com um fato estarrecedor: Nem naquele Estado, nem em um outro qualquer do Brasil houve sequer tentativa de qualquer mudança.
A tese do coordenador da “força” foi logo depois, corroborada pelo recém empossado Ministro da Segurança Pública, Raul Jungman, que afirmou; “O sistema de segurança no país está “falido””.
Tais afirmações reforçam uma tese, há tempos, defendida pelos operadores de segurança pública em nosso País. Por mais que se façam pequenos ajustes no atual modelo, permanecer insistindo em uma forma de atuação completamente ultrapassada parece ser um dos mais crassos erros dos gestores públicos brasileiros.
Por fim, se a intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro e a criação do Ministério da Segurança Pública representam algo significativo para o Brasil? A resposta é simples: Sim. Demonstra que o atual modelo mantido sob força política pelos atuais gestores das policiais investigativas e ostensivas no Brasil está completamente ultrapassado e que tais eventos forjam o oportuno momento para se sucumbir de uma vez por todas a forma de atuação das polícias brasileiras que há mais de quarenta anos vem demonstrando estar completamente esgotada de modo que se revelou contraproducente. Assim, é fundamental que o parlamento brasileiro se debruce urgentemente sobre a questão redefinindo completamente a forma de atuação de suas polícias de maneira que as mesmas adotem urgentemente; Entrada única na corporação, com ascensão unicamente meritocrática, ciclo completo de atuação nas polícias, incorporação das guardas municipais como importante componente de tal estrutura, redefinição do modelo penitenciário, definição do espectro de atuação de cada polícia, por exemplo. Ainda há esperança.
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