Alfredo Neves

28/04/2020 00h02
 
O monumento ao atleta do antigo Machadão e as diversas obras de Ziltamar Sebastião Soares de Maria, o Manxa
 
Para falar da obra é preciso saber quem é o artista, porque afinal há obras de artes em qualquer esquina, mas nem todas são dignas de admiração e reconhecimento. Para os de cabelos grisalhos e cansados de guerra, uma reacende fortes lembranças, admirada que foi e fotografada por milhares. Antecipo-me, além de outros trabalhos de Manxa que enumerarei aqui, falando daquela que poderia ter resistido ao tempo, mas infelizmente se sucumbiu à força bruta do homem, a importante e grandiosa estrutura que até o ano de 2001 era um dos símbolos da Arte Contemporânea em Natal, que era o Monumento ao Atleta. A escultura era de metal e composta por três grandes atletas de braços abertos com os aros dos cinco continentes sobre as suas cabeças, representando a união simbólica das nações. Essa escultura ficava no entorno do Machadão, antigo e monumental monstro sagrado das grandes partidas de futebol, demolido que foi para dar lugar a atual Arena das Dunas. O Monumento ao Atleta foi cravado naquela localidade em 1975. Pelo estado deplorável, comprometida pelo tempo e consequentemente deteriorada pela ferrugem, dali ela desapareceu para sempre. A não conservação de tão singelo e marcante trabalho do falecido Manxa causou revolta e escancarou o descaso de quem deveria preservar a nossa história. Uma coisa é certa, a teremos ad eternum em nossa memória, assim como o seu criador.
 
Ziltamar Sebastião Soares de Maria (1949 – 2012), nasceu na cidade de São Vicente, é Neto de Maria Antônia do Santíssimo (1890 – 1974) e primo de outros dois artistas do RN, Iaponi e Iaperi Araújo. Como já publiquei nesta coluna, tanto Maria do Santíssimo como Iaperi Araújo e o irmão, são artistas precursores da Arte Naïf em nosso estado.  Quando falamos de Manxa, nos remetemos a entalhes, esculturas e a obras importantes, tanto na terra de Poti como no Brasil e no mundo. Manxa era um artista de práticas incansáveis na produção de trabalhos elogiados e admirados por multidões, e as suas esculturas eram feitas em bronze, granito, mármore e madeira.
 
O labor requer um esforço e concentração do artista. A talha na verdade é a técnica utilizada para a confecção das esculturas, e poderíamos por assim dizer que o ato de esculpir chega ao resultado esperado depois de dias de suor e alegria.  A talha utiliza ferramentas diversas, e a escolha desse ferramental utilizado se adequa ao material em que o artista pretende trabalhar para criar a sua obra de arte, pode ser a lima, a goiva, lixa, formão e outros instrumentos adequados. Com as inovações tecnológicas muitos artesãos e escultores recorrem a um vasto maquinário moderno, que vão desde tornos eletromecânicos às inovadoras  impressoras 3D. Há pessoas que acham que perde o brilho das origens históricas para chegar a um resultado com base nas tradições abraçadas pelo artista, quando se usa das inovações tecnológicas, no entanto, entendo que as novas tecnologias e o próprio tempo possibilita ao uso e a adequação às novas técnicas.
 
O entalhe foi utilizado na antiguidade, na idade média, na África Oriental, no Egito, na Itália, em Portugal e em diversos países do mundo. Entalhava-se cadeiras, divã, artes sacras, portas de igrejas, grande monumentos em diversas civilizações,  e teve o seu apogeu no Período Barroco, Movimento criado na Itália, no século XVI, e que se disseminou logo em seguida por diversos países da Europa. O Barroco não se resumiu apenas às esculturas, mas também teve forte influência na musica, no teatro, na literatura e também na pintura.  É do conhecimento de quase todos das belíssimas esculturas, das magníficas obras arquitetônicas, das lindas artes decorativas e os elementos que circularam e eram evidenciados tanto no Alto Renascimento (1450 - 1527), no Maneirismo (1515 - 1600) indo até a contrarreforma (1545), apenas para situar o leitor da importância e do uso do entalhe ao longo da história. No Brasil, muitos foram os entalhadores e artistas importantes no período colonial, a citar: Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1730 – 1814), Mestre Valentim (1744 - 1813), Caetano da Costa Coelho, nascido em Portugal e falecido no Rio de Janeiro e José Joaquim da Rocha (1737 – 1807) e, sem falar, é claro, das centenas de europeus e um dos mais famosos de todos: Michelangelo (1475 – 1564), o importante pintor italiano do teto da Capela Sistina e escultor da Pietá e o Escravo Morimbundo.
 
Como escrevo desde o começo, a ideia central dos meus textos tem essa finalidade de divulgar o artista e inserir o leitor nessa jornada, para que ele, o leitor, tenha uma mínima noção da origem do movimento artístico e das técnicas utilizadas pelo artista aqui descrito, identificando dessa forma, com base na minha análise crítica, as escolas percorridas pelo pesquisado, permitindo despertar a curiosidade e aprofundar, se necessário,  o estudo de cada tema abordado.
 
 Percebam que o entalhe e a escultura têm uma vasta caminhada até chegarmos aos dias atuais, e, artisticamente falando, Manxa foi um escultor e entalhador importante do RN. Temos outros, que em breve escreverei aqui, como o macauense José Jordão Arimatéia (1949-), ou Jordão, como todos o conhecem, escultor do Anjo Azul que ficava na Hermes da Fonseca e misteriosamente e de forma insana foi detonado por uma persona non grata, no meu entender, das artes em nossa cidade. 
 
No livro Canção Ingênua (2014), de Iaperi Araújo, muitas personalidades do RN fazem referência a Manxa. O livro é sobre Maria do Santíssimo Sacramento, a dona Maria de Seu João Maria, ou Maria Antônia do Santíssimo.  Apesar da narrativa firmar-se sobre a vida de uma artista ilustre, o seu neto de tão igual quilate não poderia passar despercebido.
 
Por essa razão, respeitosas citações de gente da nossa literatura e da arte potiguar referenciaram o neto de dona Maria. Cito, então, uma delas: “Maria Antônia do Santíssimo e Manxa dão notícia desse milagre nos desenhos e entalhes que enfeitam esta galeria de Artes do Município... Manxa, o neto mais disciplinado, vivente da cidade agitada e ambiciosa já sabe o que faz: talha a madeira rude...  Manxa firmou, na cidade, uma presença nova. Seu entalhe é quase único na riqueza consciente do seu trabalho”. (Newton Navarro, 1966, apresentação da exposição na Galeria de Artes da Prefeitura de Natal, in: Canção Ingênua, 2014, p.36-37). 
 
As artes de Manxa de maior destaque em Natal, além do Memorial ao Atleta, são: o Sol e as suas máscaras africanas, Maias, Incas, nativas e cubistas num grande mural na reitoria da UFRN, Imagem de Santana em Caicó, o Pórtico dos Mártires de Uruaçu e Cunhaú, o painel da Capela da UFRN, o grande painel entalhado no Banco do Brasil da Avenida Rio Branco em Natal e em outras agências do mesmo banco e da Caixa Econômica Federal , os entalhes gigantes da Pinacoteca do Estado do RN, o Pórtico dos Reis Magos na BR 101 e diversas outras no país e no mundo.
 
Manxa é um artista que alunos, professores, amantes das artes, curiosos e pessoas que têm interesse em saber sobre os nossos artistas, precisam pesquisar para manter esse legado do entalhe e da escultura nas artes.
 

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