Bia Crispim

28/04/2023 11h40

 

Ah, essas paixões

 

Tenho feito garimpagens nas minhas gavetas e arquivos. E andei descobrindo que em 2013 eu me encontrava para lá de apaixonada... Ah, essas paixões que nos deixam melosas, poéticas e enxeridas. Trago hoje dois desses achados diagnosticados com paixonite aguda. Agudíssima!

DEIXA EU DORMIR EM VOCÊ!

Deixa eu dormir em você!

Era o pedido que meus ouvidos saboreavam.

Pedido convite

Entrega e segurança,

De quem sabia que em meu peito

Sentiria paz... temperança.


Dormiria os sonhos mais açucarados

E se viessem aterradores,

Nem males, nem dores,

Pois desperto do terror, se encontraria

Inteiro e profundamente meu.


E com olhos sorridentes e madorrentos

Voltaria a devanear sorrindo

Em um mundo onde o que era

Sempre seria e sempre será.

E gozaria dos pensamentos que também me pertenciam
E iríamos nos amar... amar...


Na tranquilidade de estarmos juntos

Haveria troca, prazer e frenesi.

Aglutinaríamos nossas almas e corpos

Num encontro oxímoro de opostos

Em que teu pedido

Receberia um sim

Sim, menino, deixo-te dormir em mim!

REFEIÇÃO

Houve um tempo em que te quis inteiro.

Todo.

Apoteótico.

Feito Apolo cavalgando o Sol.

De corpo uníssono, para ser devorado de uma só vez.


Não senti o gosto nem o prazer que sonhara.

Teu sabor não foi tão bom

e tu ficaste preso na garganta

como espinha de peixe

ou angústia

ou choro de remorso.


Cuspi-te fora.

Apesar de a boca cheia d'água, 

sedenta de ti e voraz.


Aí veio o tempo em que te quis as partes.

Todas elas.

Uma de cada vez.

Petiscos para meu prazer.


Primeiro comi teu cheiro

e o olfato despertou-me a textura

e o sabor de tuas carnes.


Depois comi teus olhos

e eles me encheram de vida

e paixão

e delicadeza

e encanto.


Requintei,

sensibilizei meu paladar

e teu sabor me foi o melhor.


Em seguida comi tua boca

e nela veio teu sorriso

e tua língua

e teu hálito.


Entendi tuas palavras,

tuas ideias

e a fome que sentias de mim.


Descobri ali que tu também me querias

em teu nariz e olhos,

em tua boca e pele,

em teu coração.


Daí almocei-te 

(entrada, prato principal, sobremesa e um cafezinho para um cigarro.)

E por último deixei-me virar ceia.

À noite, tarde, toda.

Por partes,

aos bocados,

em pedacinhos.

Até que nos consumimos

e viramos sol.

Só no amanhecer.

 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).


*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).