Natural de Natal/RN, é professora e pesquisadora do IFRN, autora de poesia e contos de terror.
Em cada esquina um poeta
Numa semana que começou com a notícia de uma crise de saúde mental no Brasil, com dados bem concretos e expressivos, sendo as mulheres o público mais afetado, este 14 de março, Dia da Poesia, chegou coroado por uma lua de sangue no céu e muitas águas nesta manhã, uma forma de a natureza nos dizer que, embora as situações difíceis existam, a poesia continua sendo um antídoto ou um bálsamo contra as adversidades.
Recordo oportunamente de um trecho da entrevista concedida pela poeta e cordelista Rita Cruz às pesquisadoras do Projeto Filhas de Poty (IFRN – Campus Natal-Central) – um trabalho que visa apoiar a escrita literária feminina potiguar, mapeando e catalogando as escritoras. Para conhecer o trabalho que está em andamento, porém com algumas biografias já disponíveis, acesse: https://culturapotiguar.ead.ifrn.edu.br/index.php/periodizacao-da-literatura-de-autoria-feminina-no-rn/. Segundo Ritinha Catinha – nome pelo qual também é conhecida no meio artístico – escrever poesia foi algo que a ajudou durante um tratamento contra a depressão. Além de nos levar a habitar o ritmo, sentindo-o, a poesia serve para muitas coisas. É nesse afã da busca por ela – porque também nos tira de nossa zona de conforto – que partilharei alguns versos de autoras potiguares e também as que estão radicadas no RN, uma vez que este é o mês da mulher.
Assim diz um velho adágio de autoria desconhecida: “Rio Grande do Norte / Capital Natal / em cada esquina um poeta / em cada beco um jornal”, algo que condiz com o fato de nossa terra ser território da poesia (oral ou escrita) desde que se entende como tal.
Embora tenhamos o Dia da Literatura Potiguar, instituído pela Lei 10.622/2019, o da Poesia ainda não foi regulamentado no estado do Rio Grande do Norte. Então, por que celebramos hoje? Por ser uma tradição surgida e mantida até hoje em Natal. Essa data celebra o nascimento do poeta Castro Alves. Daí a homenagem dos norte-rio-grandenses ao baiano. Já o Dia Mundial da Poesia, por sua vez, foi instituído na XXX Conferência Geral da UNESCO em 16 de novembro de 1999.
Embora ame o 14 de Março, acredito ser importante para o RN, em termos de memória e identidade, a escolha de uma data estadual que homenageie uma voz literária potiguar. Aliás, cada município também deveria fazer sua própria homenagem.
Enquanto essa legislação não chega, vamos celebrar com um compilado de vozes femininas para proporcionar um momento de fruição e deleite nesta sexta-feira.
Erupção
Línguas, lambeijos
Seios, lábios, membro túrgido
Corpos vulcanizados
(Gilvânia Machado em Poetrix On The Rocks, 2021)
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o futuro
brinca de balanço
e mira alto
(Regina Azevedo em Lança Chamas, 2021)
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No Nordeste se diz:
O céu está todo enfatiotado.
Está bonito de chuva!
A CHUVA
– Hoje vou derramar águas para a terra de quem planta
(Leila Tabosa em O Levante das Águas, 2025)
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Não sei me conter
Meu corpo transborda
como uma folha caindo
de um quadro de Monet.
(Iara Carvalho em Meia Porção de Sol, 2021)
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rosa
botou
o vestido
vermelho
olhou
no
espelho
e
floresceu
(Adélia Danielli em Bruta, 2024)
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Casa
Habita em mim o desejo
de tê-lo, para sempre,
habitado em mim
(Lisbeth Lima em Ocupação Poética III, 2025)
I - Garganta seca
pari silêncios
no útero seco da garganta
(Fabiane Marques em Rastros D´água, 2023)
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Rompida a corda do varal
o vestido azul
se descobre pipa.
(Anchella Monte em Haicais Imperfeitos, 2020)
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Casa
Face ao fascismo
Exerça fascínio
Ao pé do ouvido
(Eveline Sin em Caninana, 2020)
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Desejo
O poema molha a língua,
deixando a cabeça loca...
Mata o desejo à míngua
ao se afastar da boca.
(Kalina Paiva em Ocupação Poética III, 2025)
Kalina Paiva
É professora do IFRN, pesquisadora e escritora.
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).