Jornalista
Pessoas perfeitas não reclamam
Já dizia a canção de Ataulfo Alves: "Amélia é que era mulher de verdade". Às vezes, eu mesma me admiro quando percebo categorias como, por exemplo, a Educação, continuarem fazendo suas reivindicações mesmo quando já melhoraram bastante a sua remuneração, historicamente falando. Um colega que trabalha há muitos anos com movimentos sociais me disse que isso faz parte do "jogo", digamos assim, porque para não estagnar a luta, é preciso continuar a levantar as bandeiras. Na prática isso significa reclamar, fato que se torna um contraponto à lógica da sociedade, que muitas vezes prefere ficar omissa diante dos problemas recorrentes.
Quantas vezes você parou para reclamar nos canais de comunicação oficial dos serviços públicos, que são, muitas vezes, inoperantes? Do transporte público, que poderia ser muito melhor para facilitar o dia a dia da gente, ou até mesmo das taxas cobradas de maneira equivocada pelos bancos? Reclamar de fulano ou ciclano, que não cumpriram suas tarefas, ainda é pior do que reclamar das instituições. Pois isso denota nossa falta de empatia, segundo me disseram. Mas por que ter empatia com pessoas que muitas vezes são até melhores remuneradas do que nós, e, ainda assim não cumprem suas obrigações e acabam nos prejudicando? De modo que eu me tornei "um saco", como me alertou uma colega, porque reclamo demais, mesmo tendo consciência de que não reclamo da vida, e sim das pessoas, dos fatos e das situações que poderiam ser evitadas.
Na família, então, sou invisibilizada porque aponto os problemas comuns, os quais somente eu enxergo, mas que nos afetam de maneira geral. As mulheres, sobretudo, não devem reclamar. "Aceita que dói menos" é que ouço com frequência. E até outras mulheres preferem as colegas que não levam seus problemas domésticos, que são recorrentes a todas nós, para o trabalho. Ouvi com admiração que uma jovem servidora é "muito profissional", porque além de ter inúmeras qualidades profissionais, depois de meses que estava no trabalho é que o pessoal soube que ela tem filho pequeno (na época, bebê). Nunca faltou e jamais alegou que precisava sair mais cedo para levar o filho ao médico.
Gente que trabalha demais e não reclama tem pontuação acima de quem reclama da sobrecarga; gente que trabalha com fome vai para o céu na primeira leva. São quase deuses e deusas, nesta classificação de que pessoas perfeitas não reclamam. Tenho convicção de que não reclamo de situações postas, como o clima - se está chovendo ou fazendo frio ou calor. Pois sei que a Mãe Natureza tem suas razões. Porém, não me isento de reclamar das pessoas, dos seres humanos, que não cuidam do meio ambiente e se tornam responsáveis pelas mudanças climáticas, que resultam em deslizamentos, avalanches, causando tanta devastação ambiental, matando e ferindo gente e animais.
Hoje estou pouco prolixa, para não correr o risco de me tornar ainda mais "pé no saco". Respira, não pira e vamos seguindo. Sem reclamar; ou, ao menos, não publicamente. Vamos ser mais categóricos. Para evitar fadiga, muitas vezes eu reclamo na fonte, no SAC - Serviço de Atendimento ao Consumidor - ou formalizo denúncias nos órgãos públicos. As pessoas só melhoram ou as situações são resolvidas quando alguém lá de cima toma providências. A conclusão é esta: reclame sim, na surdina, sem ninguém saber. Quando perceberem, você já estará lá na frente, sorrindo sorrateiramente, de preferência com os problemas encaminhados. Voilá.
*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).
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