Jornalista
Ponta Negra: ontem, hoje e sempre
Tenho muito medo do projeto de “engorda” da praia de Ponta Negra, o maior cartão-postal do Rio Grande do Norte, pois sou receosa com relação às consequências das intervenções humanas na natureza. Recentemente, tivemos o desastre ambiental no Rio Grande do Sul e, pelo que entendi, houve no passado um projeto semelhante nas margens do rio Guaíba. E o resultado, pudemos observar, foi devastador. Mas, o que me trouxe a escrever sobre este local que eu tanto amo são as lembranças e as experiências que tenho no bairro, desde minha adolescência.
A partir dos meus 13 anos, comecei a circular por todos os seus recantos: beira-mar, Alagamar, Conjunto e Vila. Sendo que, mesmo tendo morado de aluguel em diversos pontos da cidade, desde quando saí de casa, aos 20 anos de idade, nunca havia me fixado em Ponta Negra, em nenhuma de suas localidades. E, há poucos dias, do nada apareceu uma oportunidade, quando uma amiga me comunicou que precisaria de alguém para ficar em sua casa, na Vila, por uma temporada, visto que ela precisa viajar a trabalho.
Como estou numa fase de reestruturação da minha logística, vibrei muito com a possibilidade de morar no bairro que eu tanto amo, mesmo que seja por um semestre. Estou chamando minha temporada de “residência artística”, pois como sou escritora, tenho certeza de que essa fase me trará muita inspiração para novos projetos e novos textos, como esse daqui, repleto de nostalgia, pois só de caminhar por suas avenidas, ruas, vielas e becos, eu já comecei a “viajar” no tempo.
As primeiras lembranças são da adolescência, quando frequentava a casa de muro de pedra que minha amiga Jade morava. Lembro do primeiro dia que cheguei, já anoitecendo, eu aos 13 anos de idade, peguei o ônibus Ponta Negra via Alecrim (atualmente, a linha 54), e me baseei pelo endereço comercial que ela fornecera, mas eu pensei que seria o de sua casa. Ela me ensinou a descer na parada do cemitério, entrar na primeira rua à direita, primeira casa à esquerda. Eu era tão novinha e meu bairro era tão distante, que para mim foi uma longa viagem.
Já cheguei no final da tarde, procurando a Avenida Beira-mar (endereço da pousada do pai, pois me confundira, como já dissera, com seu endereço comercial), sendo que o nome da rua era outro. Aliás, talvez nem tivesse nome e fosse tipo “rua Projetada”. Fiquei tão desesperada que esqueci das instruções, só toquei a campainha da primeira casa que eu vira e, para minha surpresa, foi ela mesma que atendeu. Ou seja, tive a maior sorte e senti um dos maiores alívios de minha vida. Foi até hilário. Quando ela abriu o portão, eu me agarrei em seu pescoço, dando aquele abração.
Foram anos e anos passando finais de semana em Ponta Negra, indo à praia, dividindo os sandubas gigantescos da antiga lanchonete Tchê, uma ou outra baladinha inocente na boate Flash, até eu ficar adulta e continuar frequentando o melhor bairro para diversão na capital potiguar. Desde a cigarreira 24 horas que até hoje funciona, na esquina da ladeira que os carros sobem da praia, os shows de garagem de bandas indies, em casarões da orla, as festas no Castelo Lua Cheia e as noitadas no Taverna Pub.
Nesse meio tempo, ainda alcancei o Bar do Buraco, onde entre inúmeros shows, tive a oportunidade de assistir a apresentação do gaúcho Nei Leandro. Com relação a artistas potiguares, foi lá que conheci Cida Lobo e também a banda Alphorria. Dancei muito reggae. Parece que ainda ouço Jolian Jomas cantando “I shot the sheriff”, um dos clássicos de Bob Marley.
Isso porque ainda não falei da famosa Bodega da Praça, situado em frente à Praça do Cruzeiro, onde hoje é o supermercado Ligzarb. Era um espaço bem pequeno, gerando um aglomero nunca visto em outros espaços culturais. Ah, que saudade de tantas lembranças boas que eu tenho das minhas andanças por esse bairro tão encantador, tema de uma música da banda DuSouto, que traduz a sua vibração. “De dia é Ponta Negra, de noite é Black Point”.
Passar esta temporada na Vila está me deixando mais leve. Mesmo que eu seja sobrecarregada pelo trabalho e pouco consiga me desvencilhar de tarefas diárias, para curtir o ambiente como se fosse uma turista, poder me situar na dinâmica do bairro já está me ajudando a pensar melhor. No primeiro final de semana na área, uma amiga me chamou para ir à casa de outra amiga para tomar vinho. Fui caminhando, da Vila ao Alagamar, e passei pela casa de muro de pedra que minha amiga morava.
Acabou que eu entrei por outra via e descobri um lugarzinho charmoso, o Challet Suisse, que uma amiga administra, e eu não sabia o endereço. Eu tinha acabado de dizer a ela que estava nas proximidades, quando passei e me deparei com o estabelecimento, e ainda dei um oi e um abraço na querida, que estava acabando de estacionar.
Podemos dizer que Ponta Negra é um mundinho de possibilidades. Confesso que cheguei a sentir ciúmes dessa praia linda toda vez que meu namorado deixava de ir encontrar comigo, para irmos a Cotovelo, e saía com amigos para dar sua clássica volta a pé, das cercanias de Nova Parnamirim até o Morro do Careca, aos sábados ou domingos.
Após acompanhá-los algumas vezes, entendi a magia. Não basta ir para qualquer praia. Muitas vezes o que nós queremos é o encantamento que só Ponta Negra proporciona. Por isso, minha amiga Mumu, muito obrigada por esta oportunidade única. Estou feliz demais!
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Eliade Pimentel é jornalista, graduada pela UFRN, com larga experiência em jornalismo cultural, assessoria de imprensa, comunicação estratégica e comunicação em rede. Atua como Assessora de Comunicação na Fundação José Augusto (Governo do RN). Mãe de Alice, amante de Baía Formosa e Pium, ativista social, cultural e ambiental, autora de contos eróticos e cronista deste portal.
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