Eliade Pimentel

05/02/2024 12h06

 

A experiência Marina Abramović na Usina de Arte

 

Adoro viajar e geralmente me oponho ao sistema bate e volta quando se trata de lazer, de entretenimento, justamente porque é muito cansativo. No entanto, pela experiência que tenho de vida, às vezes essa é a melhor forma de viver o que desejamos. E foi o que aconteceu quando decidir fazer uma “certa” extravagância na companhia da minha filha e o seu namorado.

Saímos de Baía Formosa, litoral sul do Rio Grande do Norte, na divisa com a Paraíba, e fomos bater em Água Preta, no distrito Santa Terezinha, próximo a Xexéu, no estado pernambucano, divisa com Alagoas. Fomos de manhã, por volta de 9h30, e chegamos pouco mais de meia-noite. Tudo isso para viver uma das melhores experiências culturais da minha vida. Acredito que o casal jovem sentiu o mesmo, principalmente ela, uma artista em formação.

Dias antes ela falou com bastante entusiasmo sobre a inauguração da obra de arte Generator, da artista sérvia Marina Abramović. Até então, confesso, não ouvira falar dessa senhora, que tem 75 anos de idade e representa tudo o que há de mais contemporâneo na arte performática. Ao ouvir Alice falar com tanto entusiasmo, comecei a me angustiar, porque não estaria livre para acompanhá-la.

Sendo que houve uma reviravolta em minha vida profissional, de modo que eu ganhei um final de semana para viver o que eu quisesse. Ao mesmo tempo em que ela pesquisava a melhor logística, eu fiz questão de deixá-la segura de que daria certo. E lá fomos nós, em um carro fretado com exclusividade, receber aquele banho de cultura da “vovó da arte performática”, em meio a um público de faixas etárias bem variadas.

Antes de nos aventurarmos, certifiquei-me de todos os detalhes. Tratava-se de um evento gratuito, na Usina de Arte, instituição cultural instalada numa usina desativada, que deu origem ao distrito Santa Terezinha. Chequei detalhes com o contato disponibilizado na publicação do Instagram e me senti muito bem amparada, disposta e segura para pegar a estrada.

A viagem em si foi tranquila, toda vida na BR-101, até passarmos pelo município de Xexéu, conforme as instruções que a moça passou, e finalmente chegarmos à entrada do Jardim Botânico da Usina de Arte, que é um parque-museu a céu aberto. Lugar lindo, incrível, com obras muito especiais, de artistas renomados, tanto brasileiros, como estrangeiros. Senti-me mais familiarizada quando vi a obra de Paulo Bruscky, um artista pernambucano cujo nome eu ouvira falar bastante, apesar de conhecer pouco o seu trabalho.

Fiquei curiosa para saber como funciona o financiamento das obras de artes da Usina de Arte, incluindo a obra Generator (Gerador), da incrível Marina Abramović. Pois, chegamos ao local, caminhamos 2 km até a colina, onde está instalada a obra/instalação, e aguardamos ansiosamente a chegada da deusa, como as pessoas ali estavam se referindo àquela mulher de aspecto tão pleno, que nos seduziu de pronto com sua forma natural de encantamento.

A obra em si é composta por um muro de 25 metros de comprimento, 3 de altura e 2,5 de largura, onde estão distribuídos 15 conjuntos de 3 quartzo rosa, oriundos de Minas Gerais. Segundo a explicação da artista (estudiosa dos minérios brasileiros), a pedra escolhida representa o amor incondicional. E esse foi o desafio. Sentir a energia do quartzo, encostando nosso corpo em cada uma das pedras – estômago, coração e cabeça – e nos reconectar com a natureza e com nosso ser interior.

“É fácil amar seu marido, seu filho, sua família, mas é muito difícil amar incondicionalmente alguém que você nunca viu”, disse, ao explicar o sentido de Generator. Para mim, foi dado o recado. Estarei mais atenta a amar as pessoas, mesmo que eu nem as conheça. Deusa Abramović, você me seduziu e sempre serei grata a ti por tanta sabedoria. Gratidão também aos fundadores da Usina da Arte, Ricardo e Bruna Pessôa de Queiroz, pela grandiosa iniciativa. Quero voltar mais vezes, visitar o parque e também participar de outras inaugurações.

A volta, já ao anoitecer, foi como o encerramento de nossa participação na gravação de um filme. Sendo que a película estará gravada em nossa memória, eternamente. 


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