Eliade Pimentel

Jornalista

25/03/2024 11h44

 

Mulheres são maioria no transporte público: já parou para pensar o porquê?

 

Sou usuária do transporte público e não nego a ninguém. Digo isso porque estou há tanto tempo na estrada e tem gente que acha que andar de “busão” é retrocesso, é sinônimo de não ser bem-sucedida. Porém, para mim, isso não importa. Andar a pé, usar o transporte público, ou aplicativo, ou pedir carona são as minhas formas de locomoção. E faz parte do meu estilo de vida simples e saudável, vivendo o mais próximo possível do que considero que seja ecologicamente correto.

De tanto sofrer nas paradas, esperando horas a fio, e de correr atrás de ônibus, e procurar ajustar pessoas às possíveis caronas, já recebi o apelido até de MUS – Mobilidade Urbana Sustentável, quando tento ajustar esses aperreios de vida ao povo que tem carro próprio. Penso em mim e nas outras pessoas, como uma vez que convidei duas amigas moradoras de Parnamirim (RN), uma com e outra sem veículo, para se ajustarem a irem ao aniversario de minha filha.

Morávamos bem distantes e eu sabia da dificuldade de uma delas. Eu as convidei, fiz as devidas apresentações e se tornaram amigas. Esse é meu jeito de ser. Fico indignada quando alguém sai para a mesma direção que eu e não oferece, ou pior, sai de fininho ou nega carona. Já aconteceu demais. E quando o motorista não faz a gentileza de parar e abrir a porta fora da parada, em horários noturnos: depois das 22h é direito nosso, das mulheres, mas antes seria gentileza mesmo.

Porém, são muitos os motoristas que estão ali no automático, parecem que não têm mãe, nem pai, nem família, nem companheira. Para eles, é só cumprir o expediente sem se envolver com a classe operária. A sorte nossa é que tem profissionais que se envolvem mesmo com a nossa causa. Uma vez, ao atravessar a avenida, vi meu ônibus passando. Na hora pensei, puxa vida, perdi o busão. Mas, para minha surpresa, o motorista me reconhecera e estava me aguardando.

Já faz um tempo que venho pensando sobre as mulheres serem maioria no transporte público. A minha teoria é que, os caras assim que conseguem um trabalho, logo se cansam do rojão e se organizam para comprar moto. Outro dia, ao comentar sobre isso com um motociclista de aplicativo, ele refutou veementemente, dizendo que temos as mesmas oportunidades.

“E porque vocês não compram uma moto também”, dissera. Bem, eu respondi que não somos incentivadas a ter essa autonomia. E quando temos algum recurso, a maioria de nós já é mãe, e não prioriza ter moto porque tem que andar com criança. E os homens, mesmo tendo filhos, largam a mulher com a prole para trás, e vão embora. Essa é a realidade. E claro, vivem com muito mais autonomia, até mesmo para fugir das responsabilidades matrimoniais.

Vendo uma publicação de uma pré-candidata a vereadora, pela capital potiguar, a pauta de “o que querem a mulheres” logo me chamou a atenção. As prioridades elencadas por elas foram: saúde, educação e transporte público. Em se tratando de mulheres de maneira geral, é o básico do básico. Sendo mulheres moradoras da zona Norte de Natal, as demandas são muito mais urgentes. Sim, experimente pegar um ônibus ou trem para ir ao trabalho ou voltar para casa.

E pegar transporte público à noite? Desafiador. As paradas de ônibus estão sempre com mulheres em sua maioria, que se tornam alvos de assaltantes e estupradores. As prefeituras não estão nem aí, mas deveriam colocar a demanda do transporte público nas políticas afirmativas para mulheres. Somos sim, maioria nos ônibus e, além de passarmos por todo tipo de sacrifício, ainda sofremos abuso, assédio e outras formas de desrespeito.

Ao conversamos com pré-candidatas (os), vamos pedir que pensem nessa nossa condição, de sermos maioria como usuárias do transporte público. E vamos fazer uma mobilização para que nos enxerguem como maioria. E vamos pedir que coloquem mais linhas, mais segurança. Simbora, mulherada, fazer valer nossos direitos de ir e vir com muito mais dignidade. Tenho dito.  

 


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