Mônica Cavalcante

02/05/2024 09h12
 
NAVEGANDO PELAS ÁGUAS DO ARTIFICIAL:  ENTRE A CRIAÇÃO E A DISSIMULAÇÃO
 
 
O que é artificial? Eu gosto muito de refletir e partilhar sobre este tema.
 
Do Latim ARTIFICIALIS, “relativo à arte ou ao ofício”, de ARTIFEX, “artesão ou artista”, de ARS, “arte”. Artifício é outra palavra com a mesma origem. Com o sentido de “feito pelo homem” (em oposição ao “natural”), é do século XV.
 
Viver num mundo saturado pelo artificial é como estar constantemente em uma encruzilhada entre a maravilha e a máscara. A palavra "artificial", com suas raízes latinas mergulhadas na arte e no ofício, sempre me leva a pensar sobre como nós, seres humanos, somos incríveis. Transformamos elementos brutos da natureza em coisas que tornam nossa vida mais fácil e mais bela. Papel, plástico, vidro, aço – cada um desses materiais conta uma história de descoberta, de tentativa e erro, e, finalmente, de sucesso.
 
Mas, ao mesmo tempo, essa capacidade de criar o artificial tem um lado mais sombrio. É como se, junto com os objetos, nós também aprendêssemos a fabricar versões de nós mesmos que não são inteiramente verdadeiras, e compõe-se novo emprego, nova versão como nos traz o dicionário sobre o significado da palavra ARTIFICIAL. “Que age de maneira fingida, escondendo realmente suas reais intenções; falso, fingido. Aquilo que não é NATURAL.”
 
Alguns outros entendimentos como dissimulado, fingido e postiço, tanto no dicionário quanto na realidade, há uma certa insegurança para aquilo que possui artifício na sua essência. A dissimulação, essa habilidade de esconder o que realmente somos ou pensamos, parece ser uma faceta inseparável do artificial. Isso me faz refletir sobre como, muitas vezes, o artificial pode ser um espelho que reflete não só o nosso brilhantismo, mas também nossas fragilidades e medos.
 
Criando contexto, sobre o avanço da tecnologia, especialmente a inteligência artificial, essa reflexão se aprofunda. As máquinas que criamos agora podem aprender, adaptar-se e, em alguns casos, até nos superar. Isso me deixa maravilhado, apesar de também um pouco receosa. O artificial, que poderia ser uma ferramenta para ampliar nossa liberdade, muitas vezes se torna um instrumento de opressão. Aprender a discernir o real do falso nunca foi tão essencial. A arte, nesse contexto, surge como um refúgio, um lugar onde podemos explorar o significado do artificial. Artistas usam materiais sintéticos e tecnologia para nos fazer questionar o que é real e o que é fabricado. Suas obras são um convite para olharmos além das aparências, para encontrarmos beleza e complexidade onde menos esperamos.
 
Mas e quanto às nossas relações pessoais? Neste mundo onde tantas vezes nos conectamos por meio de telas, a autenticidade se torna um bem precioso. A facilidade com que podemos apresentar uma versão idealizada de nós mesmos online me faz questionar: estamos nos conectando de verdade ou apenas ampliando a distância entre o que somos e o que mostramos ser?
 
E assim, questiono não só o mundo ao meu redor, mas também a mim mesmo: Quais são os limites da nossa criatividade e interesses? E até que ponto devemos moldar a realidade para nos favorecer? Como podemos usar o artificial não como uma máscara, mas como uma ponte para um entendimento mais profundo de nós mesmos e do mundo? Afinal, onde fica a linha que separa o criador da criatura? E mais importante, estamos preparados para as consequências dessa nova realidade?
 
Percebo, enfim, que o desafio está em encontrar um equilíbrio entre a inovação e a autenticidade. No fim das contas, acho que o artificial é realmente um reflexo de quem somos: seres capazes de criar maravilhas, mas também de nos perdermos em ilusões. As respostas a essas perguntas vão definir o futuro da nossa relação com o artificial – um futuro cheio de potencial, mas também de cautela.
 

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