Mônica Cavalcante

Professora e feminista

28/05/2024 06h52
AS REGRAS DO JOGO: MOVIMENTOS SOCIAIS E A TRANSFORMAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA
 
Ao refletir sobre a importância dos movimentos sociais, percebo que eles desempenham um papel crucial na transformação da sociedade. Esses movimentos são, essencialmente, agrupamentos de pessoas que se unem em torno de causas comuns, buscando promover mudanças sociais, políticas e econômicas. Acredito que os movimentos sociais são fundamentais para a democracia, pois permitem que vozes marginalizadas sejam ouvidas e que demandas coletivas ganhem visibilidade.
 
Historicamente, os movimentos sociais têm sido motores de grandes transformações. Por exemplo, o movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, liderado por figuras como Martin Luther King Jr., foi essencial para a conquista de direitos iguais para a população afro-americana. No Brasil, o movimento das Diretas Já foi crucial para o fim da ditadura militar e a redemocratização do país. Esses exemplos ilustram como a mobilização popular pode desafiar estruturas de poder e promover mudanças significativas.
 
Eu defendo que os movimentos sociais são essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Eles funcionam como mecanismos de pressão sobre o Estado e outras instituições, exigindo a implementação de políticas públicas que atendam às necessidades da população. Além disso, os movimentos sociais promovem a conscientização e a educação política, incentivando a participação cidadã e o engajamento comunitário.
 
No entanto, é importante reconhecer que os movimentos sociais enfrentam diversos desafios. A repressão estatal, a criminalização dos ativistas e a falta de recursos são obstáculos que dificultam a atuação desses grupos. Além disso, a fragmentação interna e as divergências ideológicas podem enfraquecer a coesão e a eficácia dos movimentos. Apesar desses desafios, acredito que a persistência e a resiliência dos movimentos sociais são fundamentais para a continuidade da luta por direitos e justiça social.
 
Os movimentos sociais no Brasil têm desempenhado um papel crucial na luta por direitos e na transformação da sociedade. Segundo Maria da Glória Gohn, uma das principais teóricas sobre o tema, os movimentos sociais são "ações coletivas com um forte componente de identidade, que buscam transformar aspectos da sociedade, seja em termos de valores, normas ou estruturas". Esses movimentos, ao longo das décadas, têm se adaptado e evoluído, refletindo as mudanças e desafios enfrentados pela sociedade brasileira.
 
No contexto atual, observa-se uma crescente profissionalização e institucionalização dos movimentos sociais. Muitas dessas organizações têm se estruturado como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), buscando maior legitimidade e acesso a recursos. As OSCIPs, regulamentadas pela Lei nº 9.790/1999, permitem que movimentos sociais formalizem suas atividades, obtenham financiamento e estabeleçam parcerias com o setor público e privado. Essa formalização, por um lado, oferece oportunidades para a ampliação de suas ações e impacto social. Por outro lado, levanta questões sobre a autonomia e a essência dos movimentos sociais.
 
A atuação das OSCIPs no Brasil é multifacetada. Elas atuam em áreas como educação, saúde, meio ambiente, direitos humanos, entre outras. Através de projetos e iniciativas, buscam promover mudanças estruturais e atender às demandas das comunidades. No entanto, a dependência de recursos externos, seja de empresas privadas ou do Estado, pode influenciar suas agendas e prioridades. A busca por financiamento muitas vezes coloca essas organizações em uma posição delicada, onde precisam equilibrar suas missões sociais com as exigências dos financiadores.
 
Além disso, a relação entre movimentos sociais e partidos políticos é complexa e multifacetada. Enquanto alguns movimentos mantêm uma postura de independência, outros se alinham a partidos específicos, buscando maior influência e capacidade de mobilização. Essa relação pode ser benéfica, proporcionando maior visibilidade e apoio político. No entanto, também pode levar à instrumentalização dos movimentos, onde suas agendas são subordinadas aos interesses partidários.
 
A arrecadação de recursos e o acúmulo de capital são aspectos centrais na sustentabilidade dos movimentos sociais. A profissionalização das OSCIPs trouxe consigo a necessidade de desenvolver habilidades em captação de recursos, gestão financeira e prestação de contas. Essas competências são essenciais para garantir a continuidade das ações e projetos. No entanto, a ênfase na arrecadação pode desviar o foco das questões centrais e das lutas históricas dos movimentos sociais.
 
A reflexão sobre as "regras do jogo" nos movimentos sociais brasileiros levanta questões importantes sobre a natureza e o futuro dessas organizações. A institucionalização e a profissionalização são necessárias para garantir a eficácia e a sustentabilidade das ações. No entanto, é crucial que os movimentos sociais mantenham sua essência, autonomia e compromisso com as causas que defendem. A dependência de recursos externos e a relação com partidos políticos devem ser geridas com cuidado, para evitar a perda de identidade e a instrumentalização das lutas sociais.
 
Em última análise, os movimentos sociais são fundamentais para a construção de uma sociedade mais justa e equitativa. Eles representam a voz das comunidades, lutam por direitos e promovem mudanças estruturais. No entanto, é essencial que as "regras do jogo" sejam constantemente questionadas e revisadas, para garantir que esses movimentos continuem a ser agentes de transformação social, mantendo sua autonomia e compromisso com a justiça social. A reflexão crítica sobre a atuação das OSCIPs e a relação com partidos políticos é fundamental para fortalecer os movimentos sociais e garantir sua relevância e impacto na sociedade brasileira.
 
A importância das organizações da sociedade civil, incluindo ONGs, empreendedores sociais e ativistas de direitos humanos, é inegável. Como argumentado por Ana Fontes em seu artigo na Folha de S.Paulo, essas entidades desempenham um papel vital na promoção de direitos, na inovação social e no preenchimento de lacunas deixadas pelo Estado. Sem essas organizações, muitas das conquistas sociais e avanços em direitos humanos que temos hoje não seriam possíveis.
 
No entanto, a profissionalização e a busca por recursos não devem desviar essas organizações de suas missões centrais. É crucial que mantenham sua independência e compromisso com as causas que defendem, mesmo diante das pressões externas. A relação com partidos políticos e financiadores deve ser gerida com transparência e ética, garantindo que as agendas dos movimentos sociais não sejam cooptadas por interesses alheios.
 
Em suma, as "regras do jogo" nos movimentos sociais precisam ser constantemente avaliadas e ajustadas para garantir que essas organizações possam continuar a desempenhar seu papel transformador na sociedade. A luta por uma sociedade mais justa e equitativa é contínua, e os movimentos sociais são atores essenciais nesse processo. Manter a integridade, a autonomia e o compromisso com a justiça social são fundamentais para que possam continuar a ser agentes de mudança e esperança para milhões de brasileiros.
 
 
Mônica Cavalcante (A autora é mestranda em Antropologia Social, especialista em Pedagogia Institucional e graduada em Letras com habilitação em Línguas Portuguesa e Inglesa e suas respectivas literaturas. Sua atuação se destaca na defesa e difusão da ciência, na ampliação do apoio científico para políticas públicas e no desenvolvimento de tecnologias sociais e assistivas. Comprometida com a valorização e apoio a populações historicamente sub-representadas, é engajada social e politicamente, participando de movimentos e conselhos que promovem a igualdade de gênero, o combate à violência e o empoderamento feminino.)
 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).