Eliade Pimentel

Jornalista

15/10/2024 12h43

Os suspiros e as gargalhadas de Celinha Freire

 

Tem pessoas que nascem para brilhar, para fazer a gente feliz. E são essas pessoas que continuam a nos fazer felizes mesmo quando passam por diversas situações difíceis na vida. E assim foi com Célia Freire, uma jornalista retumbante que nos deixou há poucos dias. Vi colegas se referindo a ela como um abre-alas para o mercado, fato que não aconteceu comigo, de ter tido um emprego duradouro por sua indicação. Após ler tantos relatos, fiquei feliz por saber que entre tantas qualidades, ela também foi esse importante referencial para tanta gente boa que tem no jornalismo potiguar.

Tive a satisfação de ter trabalhado na Tribuna do Norte quando ela era editora e fizemos amizade para a vida. Sempre muito alegre, protagonizei uma cena muito engraçada quando fui cobrir uma procissão católica. Cheguei meio zoada da rua, tentando entender como transmitiria as informações de algo que eu não entendo muito, por não ter vivência, que é o catolicismo. Na rua, pedi informações a uma senhorinha, que me disse meio cabreira: “você não é católica?” Ao contar essa história para a editora, do nada Celinha grita: “colocaram uma hereeege para cobrir a procissão de Corpus Christi!”

Não me considero ateia, mas não tenho religião. E entrei na brincadeira. Na hora, a espontaneidade de Celinha contagiou toda a redação. Foi uma risadagem grande. Ela saiu da TN e continuou na assessoria do Sebrae-RN. Era sempre uma alegria falar com ela, que resolvia as coisas ou dava os encaminhamentos, de modo muito profissional. Depois, eu comecei a vender bolos e, uma vez ou outra eu passava por lá, ou ia a sua casa, no Alecrim, para entregar o bolo de banana, que ela adorava, e sempre aproveitávamos para conversar e dar risadas.

Quando eu comecei a escrever no Potiguar Notícias, criei as listas de transmissão para divulgar minhas crônicas. Foi quanto estreitamos mais nossos diálogos, ela sempre elogiando meus textos e as abordagens sobre meu propagado estilo de vida simples e saudável. Depois, passei pela Sedraf, a secretaria de estado que cuida da Agricultura Familiar, e a conectei ao Mercado da Agricultura Familiar e às feiras que aconteceram no período em que eu estava por lá.

Na pandemia, divulguei o canal para entregas. Já bem debilitada, Celinha sempre me agradecia a comodidade de receber em casa produtos fresquinhos do campo. Ela também admirava os relatos das minhas vivências em Pium e Baía Formosa, até que durante o veraneio, que coincide com a época das mangas, marcou de ir com a irmã colher manga espada. Ela não entrou na chácara, localizada na Rota do Sol, a caminho das praias do litoral Sul, visto que o terreno é íngreme, e ficou a tomar uma água de coco enquanto enchíamos um saco gigantesco de mangas frescas do quintal.

A intenção da colheita, ela me confidenciara, era fazer uma doação para senhoras de uma entidade cuja sede fica no bairro de Mãe Luiza, na zona Leste de Natal (RN). Toda feliz e animada, ela me mandou fotos da entrega. Nas imagens, as idosas felizes, lambuzadas de mangas. Foi uma alegria imensa ter contribuído de forma tão singela, e absolutamente sem ônus, para a felicidade geral das irmãs Freire e das senhorinhas. Quem não gosta de manga espada, colhidas de um quintal orgânico?

Celinha foi uma das colegas mais engraçadas que eu conheci, mas também muito altruísta e uma pessoa de fino trato, que colocava calor humano em tudo o que fazia. Era extremamente caridosa e simples. Por eu atuar na Cultura do Estado, ela me agradecia as notícias culturais que envio com regularidade e certa vez pediu para eu tentar acesso para o concerto da OSRN, porque ela não conseguia reservar os ingressos gratuitos no site.  Toda solicitação de Celinha vinha com muita delicadeza, pois tinha receio de estar incomodando. Claro que eu sempre a atendi em tudo o que estivesse ao meu alcance.

Quem trabalha em redação sabe que somos “mortos de fome” e não dispensamos um lanchinho grátis, uma guloseima. Pois, era sempre uma festa quando ela chegava com um saco de suspiros, aqueles coloridos, cor de rosa, azul, verde, amarelo, comprado numa mercearia perto de sua casa. Até hoje, toda vez que eu vejo um suspirão daqueles coloridos, vendidos em unidade nesses mercadinhos de bairro, minha memória volta àqueles momentos de pura descontração na redação da Tribuna do Norte, quando suspirávamos pelos suspiros de Celinha. Sempre tão carregados de doses extras, não só de açúcar, mas sobretudo de afeto.


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