Fábio de Oliveira

17/01/2023 10h18

 

Dores para entretenimento cultural

 

O audiovisual e o cinema são sem dúvidas, potentes instrumentos da indústria cultural. Das salas do cinema até as transmissões via streaming em plataformas gratuitas e/ou pagas, podemos consumir os mais variados formatos e gêneros de produções fílmicas. No entanto, porque não questionamos sobre quem se beneficia e quem patrocina determinadas narrativas?

Em vistas rápidas no painel por algumas destas plataformas, ficamos surpresos com a quantidade de filmes sobre assassinos que ganharam protagonismo em produções estadunidenses e brasileiras e como estão bem avaliadas nessas plataformas. A quantidade de diretores e roteiristas que apostam na concretização de narrativas que só trazem revivências de dores das vítimas (quando já não estão mortas) e seus parentescos e ainda são premiados por isso.

Um exemplo disso, são os filmes dos assassinos em série Jeffrey Dahmer e Ted Bundy. É possível encontrar várias destas produções e até indicações a premiações. Recentemente o ator Evan Peters foi premiado na categoria de melhor ator no Globo de Ouro 2023 e no momento de receber a premiação, nem ao menos prestou algum tipo de homenagem ou amparo às famílias das vítimas do personagem real que interpretou.

E por aqui, não é muito diferente, basta fazer um passeio pelo painel dessas plataformas que encontramos mais do mesmo. Como a minissérie de 2021, da qual traz entrevistas da esquartejadora do herdeiro de uma multinacional de produtos alimentícios processados. Na tentativa de explorar o caso, a produção apela para lágrimas de crocodilo para justificar o brutal esquartejamento que ganhou as telas das mídias.

Já no terceiro filme, um dos mais famosos e chocantes casos de assassinatos televisionados, que foi a do casal Richthofen, também já ocupa as telas. Tendo como elenco até ex-participantes de um famoso reality show brasileiro. Apenas para reforçar o nível de psicopatia da assassina.

No RN, também teve produção que trouxe à tona por meio de documentário, dolorosos relatos de familiares que teve seus parentes mortos em uma histórica chacina no estado. Cerca de 15 pessoas foram executadas a tiros em menos de 24h no munícipio de São Gonçalo do Amarante. É nítido o total desconforto dos familiares em frente às câmeras, como também é nítida a violência em que essas pessoas foram submetidas em ter que falar sobre essas dores e a ausência de sensibilidade de quem estava por trás das câmeras.

É necessário questionar para quê e quem se favorece na execução e concretização dessas narrativas audiovisuais e cinematográficas em que nada vão contribuir. Pelo contrário, nutrem sofrimentos e eternizam lutos, banalizam a fama de pessoas terríveis da sociedade e as deixam no holofote por muito tempo. Se a indústria cultural apenas foca em gerar entretenimento e consequentemente dores às vítimas sem o mínimo de olhar sensível a elas, que boicotemos o consumo dessas produções e fiquemos atentes quem está por trás desses produtos que são um desserviço.

 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).


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