Fábio de Oliveira

24/01/2023 07h11

 

Os heróis dos Yanomamis?

 

A gestão presidencial e a comitiva de ministros desembarcaram nas Terras Yanomami no último sábado (21), no estado de Roraima. Dessa vez, até as mídias internacionais direcionaram seus holofotes para os caóticos impactos causados pelas atividades do garimpo ilegal na região, como se fosse uma novidade. Mas os ataques aos nossos povos não se limitam a esse fato, essa é a ponta do iceberg.

É de extrema importância sabermos que a invasão do garimpo não é de agora. Desde a ditadura militar que o povo Yanomami tem sido alvo de danos gigantescos às suas existências. Um histórico de violações constantes dos direitos humanos e inúmeras degradações ambientais. Mesmo com a demarcação territorial em 1992, os ataques não cessaram e uma série de violentos episódios fazem parte dessas lutas.

Estupros, mortes, doenças e outras absurdas consequências somam-se a proposital omissão de um assumido governo genocida. Em prol de uma lógica de desenvolvimento que não tem nenhuma lógica para nossos povos e ideais eugenistas que seguem nos silenciando e nos apagando. Esse descaso já atravessa anos e se agravou na gestão anterior.

Sem deixar de ser solidário com os parentes Yanomami, mas pretendo provocar a atenção e reflexão para um caso maior e mais complexo e que exige de nós, um olhar mais sensível e que reconheçamos a própria ignorância. A questão principal é compreender a riqueza cultural, o conjunto de ciências e a ancestralidade de cada um dos nossos povos.

 

Aproximando o olhar para uma realidade mais próxima, aqui no RN, há cerca de 16 comunidades indígenas que possuem suas etnohistórias, saberes e tantos outros valores, e que tem se articulado e lutado pela demarcação de seus territórios para conter o avanço da especulação imobiliária, latifúndio, monocultura e atividades de carcinicultura, em algumas regiões. E não só isso. As lutas também são por educação e saúde diferenciada que seguem constando apenas em documentos constitucionais. Mas não vemos nenhum "salvador" e pessoas que transcendam suas revoltas para além da tela do celular para contribuir com essas e tantas outras lutas.

Além da máquina capitalista de moer todes que são diferentes de um padrão imposto, muitos são os que invisibilizam e desconhecem sobre nossas existências e contextos, também em outras regiões da Pindorama. Continuam reproduzindo narrativas que favorecem ideologias coloniais por meio da indústria cultural e seus múltiplos aparatos para ganhar titulações e tomar lugares de fala. Essas condutas também são violentas, contribuem para um genocídio epistêmico cada vez mais ofensivo e são fomentados por uma nociva ineficiência de formações na educação sobre nossos povos.

Não é prestando solidariedade ao povo Yanomami nas redes sociais que você estará contribuindo com as lutas indígenas nem tão pouco engajando politicamente sobre e com as nossas lutas. É conhecendo e fortalecendo as realidades dos nossos povos ao seu redor e tensionando medidas realmente efetivas para a erradicação das violências e da subalternização dos nossos.

Apoiar e fortalecer as lutas dos nossos povos não são feitas compartilhando notícias de momento, até porque a crise humanitária, mortes e perseguições são realidades violentamente inseridas. Os Yanomamis, os Potiguaras, os Xucurus, os Tapuias dentre tantos outros com distintas cosmopercepções e modos de coexistir.

Que não deixemos ofuscar as riquezas culturais e intelectuais dos nossos povos em detrimento das violências desse sistema colonizador. E que fiquemos atentes aos jogos políticos e quem está se favorecendo com nossas dores.

 

*ESTE CONTEÚDO É INDEPENDENTE E A RESPONSABILIDADE É DO SEU AUTOR (A).


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