Hugo Manso

Engenheiro e professor do IFRN - Presidente do Conselho Curador da FUNCERN

25/10/2023 09h45
 
 
 
 
Cooperativismo: 
Desde a Revolução Industrial a sua atualidade no 
Rio Grande do Norte
 
As Revoluções Burguesas (1640-1848) na Europa, baseadas nas ideias iluministas, afirmaram a liberdade, os direitos do homem, o livre mercado e se opuseram ao absolutismo dando origem a uma nova classe dominante, a burguesia. Na  economia, a Revolução Industrial (1760-1830) acelera o processo de urbanização e as transformações científicas e tecnológicas fazem a transição dos métodos de produção artesanais para a produção por máquinas e a substituição da madeira pelo carvão mineral.
 
Segundo Hobsbawm (1981), as condições econômicas, sociais, políticas e intelectuais que produziram a dupla revolução, política e econômica, foram suficientemente profundas e estabeleceram um domínio do globo por uns poucos regimes ocidentais que não têm paralelo histórico e modificaram a forma de produzir bens materiais e a forma de pensar e agir de toda humanidade.
 
“As palavras são testemunhas que muitas vezes falam mais alto que os documentos. Palavras como indústria, fábrica, classe média, classe trabalhadora, capitalismo e socialismo. Ou ainda, aristocracia e ferrovia, liberal e conservador como termos políticos, nacionalidade, cientista e engenheiro, proletariado e crise (económica). Utilitário e estatística, sociologia e vários outros nomes das ciências modernas, jornalismo e ideologia, todas elas cunhagens ou adaptações deste período. Imaginar o mundo moderno sem estas palavras é medir a profundidade da revolução [...] que constitui a maior transformação da história humana desde os tempos remotos quando o homem inventou a agricultura e a metalurgia, a escrita, a cidade e o Estado. Esta revolução transformou, e continua a transformar, o mundo inteiro.” (HOBSBAWM, 1981, p. 11).
 
O Cooperativismo surge nesse ambiente. É mais um produto da efevercência política e economica do período da Revolução Industrial. O surgimento das máquinas a vapor e a substituição das Guildas pelas Fábricas provocou, por um lado, muitas ofertas de trabalho e as grandes concentrações industriais. Simultaneamente vive-se a urbanização acelerada sem preocupações socio ambientais que reforçam o sofrimento do trabalho e o empobrecimento das famílias. Moradias em péssimas condições de higiene, ausência de espaços, de lazer e a quebra da organização do trabalho artesanal, força a busca por alternativas coletivas inovadoras.
 
O cooperativismo surge com objetivos de coletivizar mecanismos de distribuição de alimentos, melhores salários, redução da jornada de trabalho e melhorias das condições de trabalho e moradia dos trabalhadores e suas familias. O exemplo clássico dessas ideias, vem do socialista utópico Robert Owen (1772 – 1858), educador e considerado “pai da cooperação” que entre outras vivencias estabeleceu o pioneirismo das escolas para adultos e crianças dentro das suas próprias fábricas.
 
O Brasil, que não viveu a experiencia da revolução industrial europeia, teve na colonização jesuíta em especial nas missões, uma vivencia cooperativista. A ideia do trabalho coletivo, da organização compartilhada da produção e do consumo foi difundida em pequenos grupos desde o Brasil colônia. Entretanto, somente em 1889 foi fundada a primeira cooperativa brasileira. Semelhante as primeiras experiencias inglesas, o foco era a compra e distribuição de alimentos entre os cooperados. 
 
“No Brasil, o movimento cooperativista se iniciou oficialmente com a Cooperativa Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto, em Minas Gerais, em 1889 e outra no Rio Grande do Sul, em 1902. A primeira cooperativa de crédito foi criada na cidade de Nova Petrópolis, pelo Padre suíço Theodor Amstad e, até hoje, ainda permanece em funcionamento. “(PINHEIRO, 2008).
 
Em dezembro de 1969, sob a orientação da ditadura militar acontece a unificação do movimento durante o IV Congresso Brasileiro de Cooperativismo. É criada a Organização das Cooperativas Brasileiras, OCB. Esse gesto político ampliou bases territoriais para o cooperativismo sendo a OCERN, Organização das Cooperativas do Rio Grande do Norte, a representação potiguar do mesmo. 
 
Em seu site ocern.coop.br esta registrado: “Após a união das Organizações Nacionais representativas do Cooperativismo brasileiro, a UNASCO (União Nacional das Associações Cooperativas) e a ABCOOB (Aliança Brasileira de Cooperativas), nasceu a OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras) em 1969. No Rio Grande do Norte, a UCERN, filiada à UNASCO, transforma-se em OCERN em 1970, uma das mais antigas do Brasil.
O primeiro Presidente da UCERN foi Múcio Vilar Ribeiro Dantas, da Cooperativa dos Plantadores de Cana do RN Ltda. O primeiro da OCERN foi Rivaldo Pinheiro, da Cooperativa de Crédito dos Servidores Civis e Autarquias da União Ltda. O primeiro Presidente da OCB/RN foi Roberto Coelho da Silva, da Cooperativa de Energia e Desenvolvimento Rural do Agreste Potiguar Ltda.” (fonte prof. Lucena)
 
Completando 60 anos, a OCERN mantem no Rio Grande do Norte os 07 principios do cooperativismo. Adesão livre e voluntária; Participação econômica dos membros; Educação, formação e informação; Interesse pela comunidade; Gestão democratica; Autonomia e independência e Intercooperação.
 
Enquanto ideia de modelo econômico sustentável, o cooperativismo fortalece os pequenos e médios produtores, a preservação ambiental e combate as desigualdades sociais. 
 
Alguns exemplos bem conhecidos aqui no Rio Grande do Norte podem ser destacados. Associada a OCERN, a Cooperativa Cultural da UFRN, mais que uma livraria, um espaço de formação e de fortalecimento ao livro e a leitura. Destacam-se também as cooperativas das categorias profissionais como UNIMED e UNIODONTO e ainda cooperativas ligadas a agricultura familiar como COAFS em São João do Sabugi e a CAPESA em Parelhas. A OCERN reune portanto cooperativas de todos os ramos, urbanas e rurais.
 
A UNICAFES – União Nacional das Cooperativas da Agricultura Familiar e da Economia Solidária – tem crescido muito no Rio Grande do Norte. Com forte organização no Oeste Potiguar, as cooperativas da agricultura familiar e da economia solidária estruturam-se política e socialmente em sintonia com movimentos sindicais e populares.  
 
Hoje, o modelo de organização em REDE também se destaca, notadamente através da Rede Xique Xique que opera institucionalmente com a CooperXique. Em Apodi e hoje fortalecendo muito a organização do Mercado da Agricultura Familiar em Natal, a COOPAPI coloca-se também na vanguarda do cooperativismo nacional.
 
Essas organizações não governamentais tem contribuido muito com programas governamentais como o PAA (programa de aquisição de alimentos). Os debates de temas como o feminismo, a agroecologia, a sucessão rural e a economia solidária, se fortalecem muito com a prática das redes e cooperativas populares.
 
Vida longa ao cooperativismo e todas as redes associativistas do país.
 
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